terça-feira, 15 de agosto de 2017

 Mortágua por volta de 1700
 
Para dar uma ideia de como seria Mortágua por volta de 1700, transcrevemos a descrição que faz o Padre António Carvalho da Costa na sua obra Corografia Portugueza, e descripçam topográfica do famoso Reyno de Portugal, publicada em 1708. Mantenho a grafia original, para não perdermos o perfume antigo que dela emana.
 
 
CAPITVLO XXXIV. 
Da Villa de Mortagoa. 
No Bispado de Coimbra, seis legoas desta Cidade para o Nascente, & sete de Vizeu para o Sul, em lugar bayxo entre duas ribeyras está fundada a Villa de Mortagoa, que consta de trezentos visinhos com hũa Igreja Paroquial dedicada a nossa Senhora da Assumpção, Priorado , que apresentão os Duques do Cadaval, Casa de Misericordia , & cinco Ermidas. Tem dilatados campos, abundantes de pão, vinho, azeyte, frutas, caça , & bastante gado. O seu termo tem hũa Paroquia da invocação de São Pedro, Vigayraria, com 110 visinhos, que se dividem por estes lugares, Espinho, Villa-Nova, Barril, Val de Assores, Val de Pereyra , Val de Mouro, Val da Vide, Paradinhos, Castanheyra , as Trutas, & Val de Ovelha.
Governa-se por dous Juizes ordinários, Vereadores , hũm Procurador
do Concelho , Escrivão da Camera , Juiz dos Órfãos com seu Escrivão , outro do Judicial, & Notas, dous Almotaceis, hum Alcayde , & hũm Capitão mór com duas Companhias da Ordenança da Villa , & seu termo. Forão senhores desta Villa os ilustres Condes de Odemira , & hoje he dos Duques do Cadaval, que nella apresentão as Justiças.
 
COSTA,  P. Antonio Carvalho da: Corografia Portugueza, e descripçam topográfica do famoso Reyno de Portugal … Tomo segundo; Officina de Valentim da Costa Deslandes, Lisboa, 1708.
 
 

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Mais uma vítima da Inquisição - O bruxo da Truta


Bisbilhotando na Biblioteca digital Almamater da Universidade de Coimbra, encontramos vários exemplares de listas de pessoas, e correspondentes sentenças lidas em autos de fé realizados em Coimbra. Numa delas fomos encontrar um cidadão do Concelho de Mortágua que não fazia parte da listagem que anteriormente publicamos.
Trata-se da “Lista das Pessoas, que sahiram, condenaçoens, que tiveram, e sentenças que se leram no Auto de Fé, que se  Celebrou no Terreyro de São Miguel da Cidade de Coimbra em Domingo 30 de junho de 1737. Sendo Inquisidor Geral o Eminentíssimo, e Reverendísssimo Senhor Nuno da Cunha, Presbítero Cardeal da Santa Igreja de Roma, do Título de Santa Anastasia, do Conselho de Estado de Sua Majestade.
Por este documento tomamos conhecimento que teve “segunda abjuração de leve1 o senhor Ascenso Ferreira, de 77 anos, trabalhador, natural , e morador do lugar da Truta, Freguesia de Espinho, Bispado de Coimbra. Sobre ele pendiam as acusações de “ fazer curas com benções, e palavras supersticiozas, e presunção de ter pacto com o Demónio” e ser também “Encarchador 2.

A sentença atribuída foi: “Cárcere a arbítrio3 e  imposição de ir residir “quatro anos para o Bispado da Guarda”.
Nada sabemos do destino final deste nosso mágico serrano.

1 Abjuração de leve”, significa que o abjurante tem de repudiar uma crença, ou uma opinião emitida, embora o Tribunal considere que só encontrou leves sinais de heresia. O condenado deve repudiar publicamente, se a suspeição é pública. Terá de prometer nunca mais aderir a qualquer heresia, dispondo-se a aceitar todos os castigos que lhe sejam impostos, se não cumprir a promessa.

2 “Encarchador” é um sujeito que pratica magia, mas é uma designação a que é geralmente atribuído um sentido mau, provocando malefícios sobre pessoas ou animais.

3 Cárcere  a arbítrio” significava que estariam presos enquanto os inquisidores o entendessem