CINIRO FERREIRA AFONSO
Esta publicação não pretende ser uma biografia, mas simplesmente
um tributo a um amigo que partiu desta vida, mas não da nossa memória. Em
relação a muitos assuntos, não conseguimos reunir a informação que desejávamos.
Aqui fica aquilo que pudemos juntar. Outros farão melhor, mas esperamos dar um
pequeno contributo para isso.
Ciniro Ferreira Afonso
Nascido em Vale de Açores, Mortágua, em 6 de Julho de
1932, era filho de José Maria Ferreira e Amália de Oliveira.
Faleceu a 4 de Maio de 1985.
Os jovens de Mortágua, na minha geração, tiveram a
oportunidade de beneficiar da companhia e amizade de dois amigos, algo semelhantes
a dois “irmãos” um pouco mais velhos, ou “tios mais novos”, que nos deliciaram
com o relato das suas ricas vivências, quer fora de Mortágua, quer naquela
Mortágua que nos antecedera. Eram eles o Artur Leitão e o Ciniro Ferreira
Afonso. Deste farei hoje uma nota biográfica, com os dados que consegui
recolher.
A sua personalidade multifacetada, tornava-o popular
entre as pessoas que contactava, e rapidamente transformava um conhecido num
amigo, tal a empatia de seu relacionamento com as pessoas de qualquer estrato
social. Tempo houve em que quando em qualquer parte dizíamos a alguém que
eramos de Mortágua, frequentemente nos falavam do Ciniro. Algo parecido com o
que acontecia quando no estrangeiro se falava de Portugal, e logo os
estrangeiros referiam Eusébio ou a Amália.
No meu caso, por causa das vicissitudes da minha vida,
o convívio com o Ciniro já foi um tanto tardio, mas apesar de tudo muito rico.
Não tenho dados para fazer uma descrição cronológica
da sua vida, pelo que farei mais uma apresentação de algumas suas facetas mais
relevantes.
A sua vida
enquanto estudante de Coimbra, foi extremamente rica, embora nunca tenha
terminado o curso de Medicina que iniciou em 1952-1953. Ficou, no entanto,
celebre pela sua participação nas lutas estudantis e por ter sido durante
vários anos o Dux Veteranorum da Academia, ou seja, o aluno com mais matrículas,
e presidente do Conselho de Veteranos.
Em 1954 publica no Livro dos Quartanistas de Medicina uma
dedicatória ao futuro Dr. Bráulio Afonso de Sousa, que nos diz algo sobre a sua
amizade e a elegância do seu humor:
Era membro da República Poynta-Pau, que em 1967 tinha
8 repúblicos. Poucos
anos depois, esta república desapareceu definitivamente. Ainda tive
oportunidade de estar presente num encontro de antigos repúblicos realizado no
Vale da Mó, mas deverá ter sido um dos últimos.
Entre os muitos amigos que tinha, alguns se
destacavam, nomeadamente o Dr. Louzã Henriques, que fez questão de o referir
numa biografia da autoria de Manuela Cruzeiro e Tereza Carreiro, onde mostra as
fotografias da Queima das Fitas de 1961.
Nesta fotografia, note-se a presença de Manuel Alegre,
na ponta esquerda da fotografia, junto ao Ciniro.
Também António Avelãs Nunes nos dá um testemunho
pessoal:
Nesta fotografia, publicada por António Horta Pinto,
podemos ver o Ciniro em 1964, a dirigir como Presidente da Assembleia Geral de Estudantes, uma reunião
nas instalações da Associação Académica. São reconhecíveis algumas pessoas que
ganharam alguma notoriedade, como José Carlos Vasconcelos, que está de capa e
batina, um pouco atrás do Ciniro.
Também em 1964 fazia parte da Comissão da Semana de Recepção aos Caloiros, que se
realizou entre 19 e 22 de Novembro :
Em Abril de 1967,
o jornal O Badalo, do Conselho
das Repúblicas, publica a notícia da substituição do Dux Veteranorum:
As razões pessoais para abandonar o cargo e sair
definitivamente da Universidade e de Coimbra, prendem-se com a necessidade de
tomar conta dos negócios familiares, uma vez que o seu pai José Maria Ferreira,
falecera em Dezembro de 1966.
***
Uma faceta importante da sua vida em Coimbra foi a sua
actividade como desportista. Foi sem sombra de dúvida uma figura marcante da
história do Rugby em Coimbra.
Disso nos dá conta
uma
ACTA
DA REUNIÃO DA CÂMARA MUNICIPAL DE COIMBRA,
REALIZADA
NO DIA VINTE E SEIS DE JUNHO DE MIL NOVECENTOS E NOVENTA E CINCO,
Onde
o Vereador Jorge Lemos apresentou a seguinte proposta, que foi aprovada:
Secção de Rugby da Associação Académica de Coimbra
"O
Rugby além de um jogo é uma filosofia de vida, que assenta na camaradagem e na
amizade.
Esta
modalidade inicia a sua actividade em Coimbra , na Associaçao Académica de
Coimbra, no ano de 1936 pela mão do Dr. José Maria Antunes - também atleta da
Secção de Futebol-.
O primeiro jogo efectuou-se enquadrado na
Queima das Fitas em 1937.
Empenhados no desenvolvimento da modalidade, mantiveram os treinos
de captação de jovens e em 1940 disputaram a final dos Jogos Desportivos
Universitários com a Universidade Técnica de Lisboa, tendo perdido por 6-3.
Desta primeira equipa além do já citado Dr. José Maria Antunes,
fizeram também parte, o Dr. Felisberto Pica, um dos baluartes da história da
Academia de Coimbra.
A primeira vitória da Académica remonta ao ano de 1942
Até à época de 1954/55 o Rugby conheceu um decréscimo de
importância por razões de ordem estrutural e política.
Neste ano, com a vinda para Coimbra de António Sá Lima, o Rugby
volta de novo à Associação Académica.
Ciniro Afonso, José Brinca e José Eduardo Falcão, entre outros,
passaram a assumir a prática do Rugby, sem qualquer interrupção até ao presente
ano.
O primeiro título nacional será ganho em 1970 e em 1974, conquista
pela 1ª. vez a Taça de Portugal.
Ao longo da sua existência a Secção de Rugby da Associação
Academica de Coimbra, demonstrou uma capacidade de trabalho notável, já que com
fracos meios, sempre conseguiu manter um bom nível competitivo.
A preocupação com a motivação e estímulo dos atletas mais jovens
para a prática da modalidade, será talvez, uma das suas principais conquistas.
Só com o trabalho empenhado e grande dedicação ao Rugby dos seus
dirigentes, dos quais destaco o seu actual Presidente, Dr. António Rochete, é
possível manter um bom nível competitivo.
Na época que agora findou, a equipa sénior foi Vice-Campeã
Nacional, venceu a Taça de Portugal, o Torneio de Abertura Centro/Norte, a Taça
Primavera e o Torneio Internacional Queima das Fitas. Além dos brilhantes
resultados obtidos esta Secção manteve em competição 10 escalões etários num
total de 326 atletas.
O Rugby merece, por tudo quanto já fez pelo desporto, o respeito e
o carinho da Cidade de Coimbra.
Face ao exposto é justo que, ao comemorar os 40 anos de
existência, a Câmara Municipal de Coimbra reconheça publicamente o trabalho
desenvolvido por esta Secção da Associação Académica de Coimbra, pelo que
proponho, que de acordo com o Regulamento da Concessão de Medalhas Honoríficas
da Cidade, expresso no Art° 22º. do Cap. VI,
" A Medalha Dourada pode ser atribuída às equipas vencedoras
de provas Nacionais, bem como a Atletas, Personalidades e Instituições que
atinjam alto prestigio no campo desportivo"
lhe seja concedida a MEDALHA DE MÉRITO DESPORTIVO."
Manuel da Costa, atleta e treinador da Secção
de Rugby da Associação Académica de
Coimbra publicou um livro intitulado Simbologias do Rugby nos quarenta
anos da Académica dá um testemunho extenso e sentido do velho
companheiro Ciniro:
“O CINIRO
No aniversário quadragésimo. Com 40 anos de idade, mais do que
idade para ter juízo, a secção de Rugby da Associação Académica de Coimbra,
comemorou-o no Palácio de S. Marcos: comemorando aí pela quadragésima vez,
nessa semana, a vitória na Tça de Portugal. Então e o discurso retrospetivo da
história da secção, dos vivos, dos mortos, dos símbolos, das heranças, das
lendas, do Ciniro que lá não constou mas que existiu, que foi fundador,
jogador, director e acima de tudo referência obrigatória em todas as evocações?
Em 77, aquando da vitória no 1º campeonato a ele se fez referência
na revista “Rugby”, ainda que ligeira, com ele presente na comemoração “,,,Vai
aparecendo no Rugby Clube. Bebe um copo, que é umm rico pretexto, não jogues as
cartas , a não ser a sueca com o Ciniro e aí tens de estar calado senão ele
chateia-se…”. E em 1982(*), veio a morte “ A morte que mataste lira e
nós contámo-la na imprensa e cantámo-la junto à sua morada.
“Coimbra tem mais encanto
na hora da despedida. A morte sempre provocou, em nós, um enorme sortilégio.
Não a tememos e até encontramos nela a expressão de uma certa exaltação, mas, o
que é facto, é que conflituo com ela sempre que é brutal nas suas opções. Foi
assim na década de 60 quando ceifou as vidas aos correligionários rugbystas Quim
Ruas e Pedro Carmona a ponto de prolongada e regularmente as invocar a atitude
de grande exaltação, às vezes mesmo, simbioseada de alguma morbidez.
Desta feita, hesitámos.
Hesitámos, mas para tomar balanço. Aos dias quatro do mês de maio falecia, numa
enfermaria desta cidade, Ciniro Ferreira Afonso – o Ciniro, 52 anos de idade,
mais de 20 dedicados à ambiência Académica Coimbrã: das farras, das boémias,
mas yambém paradigma dos valores de sempre – os princípios, as tradições, as
lutas – no final de contas, o fenómeno cultural de um sector que se vertia na
cidade e se estendia à Nação. Dux-Veteranorum na década de 60, co-fundador do
Rugby da AAC na década anterior, acaba por regressar às origens – à sua Vale de
Açores – e aí continuar o apostolado da cultura, no teatro e no associativismo.
Morreu um homem, que era um bom!
O homem que foi absorventemente acompanhado à sua ultima morada
pelo seu povo e pelos companheiros de estrada. Chorado e cantado pelas velhas
repúblicas e avelha guarda do Rugby que vieram de longe, mas também e em força,
pela gente nova do teatro de hoje e da militância de sempre.”
(*)Por qualquer razão, Manuel
da Costa confunde as datas. Ciniro Ferreira Afonso morreu em 1985
Ao livro de Manuel da Costa fomos recolher as seguintes
fotografias, em que podemos identificar o Ciniro.
Actividades estivais
Da sua vivência enquanto jovem, em Mortágua, tentaremos dar uma
das muitas súmulas possíveis.
Nesses anos havia um grupo razoavelmente numeroso de estudantes de
vários níveis, a maioria deles a estudar em Coimbra, que vinham passar as
férias à terra natal, e que tudo faziam para as gozar da melhor maneira,
organizando actividades de convívio,
coma as limitações que os tempos impunham. Gozavam no entanto de uma tolerância
muito maior, e uma disponibilidade de
tempo, que os outros habitantes locais não tinham.
Segundo um esboço histórico, escrito por
José Tomás Porto, cerca de 1990, Amadeu Breda terá criado para os estudantes
que passavam as férias em Mortágua a figura do VERANA, que
definiu, em termos alargados, como “todo aquele que descansa
sete dias por semana.”
E acrescenta José Tomás:
“As férias tinham a sua maior dimensão no VERÃO e é
desta palavra que etimologicamente nasceu, seguramente, o termo expressivo
“VERANA”.
Foram VERANAS célebres o Dr. LAFAIETE, o
inesquecível CINIRO AFONSO, MANUEL MARTINS, BRUNO ROSA DA CUNHA e ARTUR NOVAIS.
Entre os vivos consideramos decanos ARTUR
LEITÃO, CELSO CRISTINA e ABRALTINO LOBO.”
Naturalmente, esta informação já está muito desatualizada.
São dessa altura as fotografias tiradas na presa do
Rio Criz, que usavam como praia e onde faziam merendas, e mesmo acampamentos:
Por vezes alguns deles também faziam férias nas praias
do Algarve, aproveitando a hospitalidade de algum conterrâneo ali residente por
motivos profissionais, mesmo que por fosse necessário estabelecer uma ligações de legalidade
duvidosa, ora acampando na zona de Monte Gordo.
No campismo, não se livravam de encontrar
outros mortaguenses:
É segredo, mas o Tino Lobo já nos confessou que nunca conseguiu ganhar ao
Ciniro uma bisca dos nove.
E não perdiam a oportunidade de conviver com campistas de outras
proveniências
***
Na mesma época também fazia a Verana uns jogos
de futebol com os atletas e ex-atletas do Mortágua Futebol Clube, que ficaram a
trabalhar na terra natal, por não prosseguirem estudos e a quem foi atribuído o
nome genérico de Arsenal. De um desses recontros ficou esta
fotografia da Verana:
Faziam também “Congressos”dos quais
possuímos uma das convocatórias,
redigida por Ciniro Ferreira Afonso, em 12 cantos de verso livre que ilustram a
sua arte poética:
IV
CONGRESSO DA “VERANA”
Convocatória
I
Pondo de lado
Ditirâmbicos dons de
oratória
Vamos lembrar a história
Do descobrimento da
memória
Em forma de palmatória
Que perpetuou um VERANA
Muito antes do MACACO (1)
Ter celebrizado a banana.
II
Voltados para a pedra
Em círculos de giz
Os Carneiros onomatopaicos
Nem nobres, nem laicos,
Veneradores e servis
D’olhar fixo na mão
Do Ínclito descobridor
Que após a destapadela
E continuando a função,
Deu a palavra ao Orador
Que também comia da
GAMELA.
III
Senhor Ouvidor-Mor
Nascido de Virgem
Homem sério
Ilustre defensor
Da comunidade
Do Império
E do Português à letra
Etc., etc., etc.,
Estamos aqui
Irmanados…
(Alea jacta est! – ou como diria qualquer
jogador de PORCA-PRENHA – os dados estão lançados!!
REPÓRTER – nesta altura e por motivos alheios à vontade deles e dos
quais deviam pedir desculpa, a aparelhagem de som HI-FI, avariou-se, o que foi
aproveitado por um dos circunstantes, o Senhor PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO de uma Companhia
de Petróleos para verter águas. Utilizou para o caso o reverso do Monumento.)
IV
Ao ver tal ignomínia
Um tal Verana Du Bocage
Recém-chegado da
Abissínia
Pediu uma pena de pato
Ao Prior do Crato
E com o sangue
Que lhe raiava os olhos
Escreveu:
Camões
Oh! grande Camões
Quão semelhante
Acho meu fado ao Teu!...
(
quão=cão. É de recusar a hipótese posta por alguns filólogos, de que “quão”
seria um aumentativo. )
V
Consternado
Virou-se p’ró outro lado (2)
E cara de chateado
O do anverso
E pediu desculpa ao Luiz
Vaz
Em verso
VI
De coroa de louros
Olho vazado
E cara de chateado
Com tamanho sururú
Disse o Épico
Lá da lage
Bocage, Bocage,
Quem és tu?
(REPORTER- O técnico de som, reparada que
foi a avaria pôs à disposição do ORADOR o maior FUNIL DO MUNDO.
LUSOPRESS – A resposta que o BARDO SADINO
deu ao epopeico só foi ouvida por um play-boy internacional de nome ROMEIRO,
que a revelou em exclusivo à nossa reportagem mas cujo conteúdo pode ser
publicado por motivos de SEGURANÇA.)
VII
O Elmano sentiu
Que, de tal Orador
A Objurgatória
Lhe causava lassidão
bovina
O que inexoravelmente
Lh’arrastaria a alma p’rá
latrina
VIII
Ei-lo, homem de
convicções
Em escapada aleatória
Pela escada da Glória (3)
Onde se vendiam melões
IX
Entrou na tasca da
esquina
Onde havia um entremês
Pediu um copo à menina
Ela serviu um de três
X
Lá no fundo
Vindos dos confins do
Mundo
Há turistas, madames,
faquistas,
Boémios e artistas
Semi-bêbedos, com ar de
sono
E uma mulher a cantar
O fado do Canto Nono.
XI
Nisto chega ao local
O Mostrengo, porco
imundo,
Chamou de lado o poeta
Que respondeu iracundo
Aunque tu Bruto?
Mas o triste, de latim
Não via puto
Teve para com a Mãe do
outro
Um pensamento fecundo
Na altura em que entrava
EL REI D. JOÃO II,
Mestre insigne
Em qualquer língua
Que tendo o dicionário à
mão
Logo faz a tradução
XII
Cai o pano quando o
decano
Do Corpo Diplomático
acreditado
Espetou uma faca
No ventre do Elmano
O qual esvaindo-se em
tinto
Chorou
Já Bocage não sou…
N.R. – Com esta
convocatória pretende-se assinalar o seguinte:
1º. -CAMÕES foi um grande VERANA
2º. -BOCAGE também o foi
3º. -ALGUNS nunca o poderão ser,
por falta de SER.
Das considerações supra
depreende-se que o NOSSO CONGRESSO vai ser feito em intenção ao grande “VAT”. (4)
$$$--Notas--$$$
(1)-
Vulgo Tio Sam
(2)-
Nada de politiquices!
(3) -
Isso da GLÓRIA é outra história!!!
(4) –Tratando-se
de whisky qualquer marca serve!
Ainda no âmbito da
Verana, a certa altura, em retribuição a uma deslocação a Pinheiro de Ázere
onde haviam sido muito bem recebidos, o Ciniro escreveu um Auto do Juiz da Terra, que
representaram junto à capela da Breda, para receber os anteriores anfitriões, quando estes retribuíram a visita.
Auto
do Juiz da Terra
de
Ciniro
Ferreira Afonso
Representado
á porta da Capela da Brêda
Junto
à Ponte do Rio Criz
AUTO
DO JUÍZ DA TERRA
Popular X 1º
Não
sei que mal se fêz
Nesta terra de bondade
Onde há um fideputa Juíz
Que não quer cá a
electricidade
Popular Y 2º
Sacador
esquecido do pobre
Da
alta burguesia adorado
Por
desviar galináceos
Meu
cumpadre Sarafim
Foi
às galés condenado
Popular X 3º
Homem
de grã pilhagem
Vive
de amores co’a Joana
Que
é um castiçal de cana
E
nada fez pela barragem
Popular Z 4º
Quando
lhe foram dizer
Que
morrera uma mulher
A
quem mandara bater
Só
por esta não querer
Ser
pra si uma qualquer
Soltou
um riso alvar
Deu
dois traques bem sonoros
E
desatou a cantar
Popular Y
5º
Nunca
lavou o focinho
Odienta
lhe é a água
Atascado
sempre em vinho
Que
raio de Juíz tem Mortágua
Popular X 6º
Se
Juíz aqui apanhara
Uma
orelha lhe arrancara
Popular Y
7º
O
Zé Maria Pincel
Sapateiro
de burel
A
quem ferrou o calote
O
pagamento lhe fez
Co’a
ponta do chicote
Popular Z 8º
Olhai!
Lá
vem o senhor Juíz
Com
a formosa senhora
Cuidando
na tirania
Do
pobre povo queixoso
E
porque degeneroso
Desprezou
os pequenos
Achar-se-á
tanto menos
Quanto
mais foi de guloso
Juíz 9º
De
quem senhores falais?
A
quem lançais tanta injúria
Porque
estais com tanta léria
De
mim não será por certo
Pois
amigo sempre fui e sou da miséria
Popular Z 10º
Que
dizeis falso e ingrato
De
mentiras és fabricante
Dos
pulhas não tens igual
Que
não és pocesso do mal
Afinal,
quem nos garante?
Juíz 11º
Não
se vos tolde a memória
De
toda a minha inocência
Pois
só por bem julguei
E
por vos calardes fazei
Que
se me esgota a paciência
Popular Y 12º
Ah
malvado que te dou!
Popular X 13º
Esse
cão danado
Vendido
aos donos do povo
Mestre
na ruindade e no roubo
Costumeiro
nos bordéis
Tantas
sacas d’ouro tem
Qu’inté
lhe faltam cordéis
Popular W 14º
E
de presunto na salgadeira
Feijão
e milho na tulha
E
andam servos à bulha
Por
lhes faltar trincadeira…
Popular Y 15º
Vamos
dar-lhe uma lição
Limpar
do mundo o poltrão
Que
mija e escarra p’ró chão
A
tudo faz baixa mão
Matemos
esse cabrão!
Juíz 16º
Fui
ladrão, fui desonesto
Fui
assassino funesto
Fui
tão mau, tão desumano
Fui
um terrível tirano
17º
Mas
senhores atentai
Por
alma do vosso pai
Escutai-me
num instante
Vêde
em mim um amigo
Pró
futuro eu vos digo
E
não somente um tratante.
18º
Distribuirei
os meus ganhos
Brocados
e pedrarias
Dar-vos-ei
vinho e pão
Tereis
em mim um irmão
Fazei-me
de tal mercê
Popular Y
19º
O
quê?!!!
Ah
grande mentiroso
Tão
ladrão e tão manhoso
Mate-se
como um cão raivoso !
Fim
***
Em 1967, regressou definitivamente a Mortágua iniciando um período
mais recatado da sua vida, mas a juventude de Mortágua ganhou mais um
companheiro, sempre disponível e bem disposto que nos ajudava a voar nas asas
da fantasia, com as fantásticas histórias que nos contava das suas andanças.
Não deixava porém de assumir responsabilidades e participar nas
actividades associativas do Concelho.
Em 13 de Abril de 1969 tomou posse como presidente da Direcção
da Associação Humanitária do Bombeiros Voluntários de Mortágua.
A Defesa da Beira de 19 de Abril de 1969 dá a notícia:
***
Dedicou-se também às actividades culturais, nomeadamente
integrando o TEM – Teatro
Experimental de Mortágua.
Ciniro Ferreira Afonso foi um dos impulsionadores do Teatro
Experimental de Mortágua, participando como actor em várias peças.
Conseguimos
reunir algumas fotografias dessas actuações:
A Sapateira Prodigiosa
Entre Giestas
Festim do Baltazar
***
Finalmente, a sua participação cívica e política. Militante, que
sempre foi, do MDP (Movimento Democrático Português), foi um dos membros da Comissão
Nacional do 3º Congresso da Oposição Democrática em 1973:
***
Em 2000, quando eram passados 15 anos sobre o seu falecimento, foi
realizada uma homenagem nas instalações do Rancho de Vale de Açores,
subordinada ao lema “Recordar o Ciniro “ que contou a participação de muitos
amigos e antigos colegas, alguns dos quais se deslocaram de Coimbra, de Lisboa e de outras terras, algumas delas bem
distantes.
Ficamos hoje por aqui. Até sempre, amigo!