domingo, 17 de julho de 2016


Dr. Assis e Santos e a História de Mortágua

 

Depois de alguns anos de esquecimento, temos assistido recentemente ao reavivamento da memória do Dr. Assis dos Santos, por iniciativa da autarquia, pretendendo salientar a sua actividade como médico e como historiador do concelho de Mortágua.

Como médico, pretende-se evidenciar a sua permanente disponibilidade e bondade, referindo que ia ver doentes a todo lado, deslocando-se a pé, e nunca cobrava dinheiro a ninguém.

A verdade é que era o único médico de Mortágua que tinha ordenado pago pelo Estado, dada a sua função de Subdelegado de Saúde. Antes de vir para a vila de Mortágua, esteve colocado como médico de partido em Espinho, e como tal recebia da autarquia.

Como historiador de Mortágua, escreveu vários livros que temos alguma dificuldade em avaliar, uma vez que não temos formação suficiente em Geologia e História. No entanto notamos que nos seus escritos nunca cita as fontes que alimentam a sua sabedoria em campos que não são os seus, o que não costuma ser bom sinal. Temos a certeza que não teria tempo, nem meios, para investigar tudo aquilo que afirma, sem recorrer a textos de outros autores especializados.

Não deixa de ser interessante verificar que alguma da produção intelectual de Assis dos Santos é sistemática e voluntariamente omitida pelos actuais biógrafos. De facto, Assis e Santos foi durante muitos anos o escriba de serviço dos salazaristas de Mortágua, que lhe encomendavam escritos e discursos. Um deles “O Nacionalismo Português na História Contemporânea”, é uma conferência lida em 28 de Maio de 1947 na Câmara Municipal de Mortágua, por solicitação do seu presidente. Outro trabalho “Comunicações Rodoviárias entre a Beira Alta e a Beira Litoral Através de Mortágua”, escrito por ele, foi entregue ao Ministro das Obras Públicas em 10 de Julho de 1947, em sessão solene na Câmara Municipal.  Podemos também  referir “As primeiras navegações oceânicas”, uma conferência pronunciada em 4 de Março de 1960, por solicitação do Presidente da Câmara de Mortágua, Artur de Gouveia Leitão.

O próprio “O pelourinho de Mortágua” foi escrito por encomenda do presidente da Câmara, Dr. António Abreu, em 1940, para integrar as comemorações dos centenários da fundação da nacionalidade (1140) e a restauração da independência (1640).

Homenageado em 7 de Dezembro de 1969, proferiu um discurso que merece leitura atenta, até porque nos dá ideia da sua personalidade e o do seu percurso de vida.

Por agora vamos centrar a nossa atenção unicamente sobre algumas passagens do seu discurso, relativas a médicos de Mortágua:

« Espero que os promotores desta manifestação compreendam a delicada posição em que me deixam perante a minha classe tão bem representada neste concelho e que eu não posso exceder em dedicação, nem na competência, nem na operosidade, para ter direito a especial consagração pública. Isto quanto aos vivos; porque dos antigos, recordarei três nomes: o Dr. João Lopes de Morais, Dr. Joaquim Tavares Festas e Dr. Teixeira Gordo».

«O Dr. Lopes de Morais foi estrénuo lutador da ideologia liberal na agitada época de D. Maria II. Mas acima de tudo um abalizado clínico cuja fama chegou à capital. Foi o único médico provinciano que teve a honra de ser chamado para observar e tratar a rainha. O doutoramento honorário premiou a cura espectacular da régia enferma».

Logo aqui constatamos várias alusões que não são verdadeiras. Lopes de Morais não foi um médico provinciano que atingiu um doutoramento honorário. Antes pelo contrário, seguiu a carreira universitária que só foi interrompida por motivos políticos.

Uma junta expurgatória, criada pela carta régia de 5 de Dezembro de 1923, propôs a sua exclusão da Universidade em 21 de Junho de 1824, com a seguinte fundamentação:

« João Lopes de Moraes, opositor em medicina. Reconhecendo a pluralidade da juncta que este opositor é dos mais distinctos da sua faculdade, não poude resistir á fama das notícias, de que elle é tido por impio no districto de Mortagua, onde elle costuma residir; e por isso fez tirar informações por alguns membros da juncta, e viu que todas coincidiam com aquellas primeiras notícias , e acrescentavam factos demonstrativos das suas opiniões em assumptos religiosos.»
(Carvalho, Joaquim Martins de :“Apontamentos para a Historia Contemporanea”. Imprensa da Universidade. Coimbra 1868)

Esta exclusão não viria a acontecer, nessa altura, por entretanto ter sido publicada uma amnistia em 5 de Junho de 1824.
Em 1928, os docentes que defendiam ideias liberais foram demitidos da Universidade, encontrando-se entre eles Lopes de Morais.
Em Julho de 1834 foram exonerados os professores promovidos por D. Miguel, e readmitidos os lentes e opositores que a intolerância política tinha afastado da Universidade, e perseguido.
João Lopes de Morais é reintegrado como lente e passa a reger a cadeira de Aforismos.
Solicitou e obteve a jubilação em 1855.

Sobre as suas qualidades como clínico, escreve Bernardo Mirabeau:
«Já por então era o dr. João Lopes conhecido em quasi todo o reino como practico, de quem se contavam successos clínicos de muita felicidade. Os serviços médicos, que prestou em Almeida, augmentaram-lhe a reputação, e até lhe conciliaram as svmpathias dos adversarios políticos.»…..
«Gozou o dr. João Lopes de Moraes de subidos créditos como medico e professor. Aquella fronte saliente, que parecia comprimir e diflicultar a mobilidade dos olhos, revelava grande intelligencia e profunda reflexão. E de facto eram estas as faculdades que predominavam no dr. João Lopes, e que elle desinvolveu por meio de aturado estudo sobre os livros e de longa experiencia do mundo. Não deixou escriptos por onde os vindouros possam aquilatar o seu mérito scientifico, mas deixou no professorado um nome illustre e de tal reputação, que muitos o appellidaram o Hippocrates portuguez da nossa edade »

( Memoria historica e commemorativa da Faculdade de Medicina nos cem anos decorridos desde a reforma da Universidade em 1772 até o presente . Autor: Mirabeau, Bernardo Antonio Serra de, 1826-1903
Publicado por: Imprensa da Universidade . Coimbra 1872 )

 E sobre a raínha D. Maria II, nada encontramos.
Conseguimos encontrar uma história parecida no livro “Noticia dos Banhos do Luso” de A. A. da Costa Simões, editado pela imprensa da Universidade em 1859. Falando das águas do Luso, escreve:

« A descoberta das suas virtudes therapeuticas deve-se a um médico d’aquelles sítios, assistente na Lameira de S. Pedro, José António de Moraes, clínico distincto, que d’alli foi chamado ao Paço, e curou d’uma moléstia grave a Senhora D. Maria I, que o brindou com o habito de Christo, com o privilegio da casa Real, e com as honras de lente da Universidade.*
* Este facto é geralmente asseverado pelos contemporâneos e parentes d’este medico; mas nunca vi os documentos respectivos. Na Nobiliarchia Médica do sr. Francisco António Martins Bastos, também não vejo o nome d’este medico no catalogo dos facultativos que fizeram serviços à Senhora D. Maria I »

Assis e Santos  refere-se à prisão de João Lopes de Morais, com a falta de rigor a que nos vamos habituando:
«Um vai-vem da política da época, lançou-o num calabouço militar – a fortaleza de Almeida – onde permaneceu um ano. »

 
A realidade foi bastante diferente. Para a ilustrar, recorremos a um excerto de uma carta aos “Senhores Deputados da Nação Portuguesa”, escrita por Lopes de Morais:

«Tão lisonjeiras esperanças foram em 1826 engodadas com a Carta aonde os bons portuguezes bebião outras d’uma sabia e justa Legislação que segurasse a cada um seu Direito, tranquilisasse os bons e reprimisse os máos: porém o resultado foi em 1828, por seis anos consecutivos tragarem o caliz d’uma perseguição horrorosa sem mais motivo nem fim, do que destruir tudo o que cheirava a constitucional para impossibilitar a volta da Rainha e da Carta, que seus inimigos tanto temião como odiavam.  Por desgraça ou por fortuna todos provarão mais ou menos deste amargoso caliz, e o supplicante  foi culpado e prêso, e por muitas vezes roubado em sua casa, abandonada com dois tenros filhos, que teve a fortuna de ver depois de 4 para 5 annos de prisão, donde soube escapar-se com honra e com a coragem cívica, que não é fácil encontrar em situação tão arriscada. Excitados por desenlace tão contrario às suas esperanças d’acabar com o supplicante e receosos os seus primeiros e últimos perseguidores,  aliás públicos e encarniçados inimigos de todos os constitucionais, depois de toda a qualidade de danno e afronta, feita durante a usurpação á casa, pessoa e família do Supplicante tratarão então de assassinar o supplicante, convidando para isso um criado seu, com promessas de dinheiro e outras, e recorrendo na falta deste a soldados, que públicamente  roubárão de novo o Supplicante, cuja vigilância o salvou da morte, passando-se para o Porto com todo o custo e risco.»

Como podemos ver, Assis e Santos foi misericordioso e libertou Lopes de Morais ao fim de um ano…
Mas, entretanto, atribuiu-lhe uma descoberta terapêutica:

«Atacado de reumatismo desde então, lembrou-se de procurar alívio numa cura hidro-mineral. A água do Luso foi a escolhida. Mandou construir uma barraca à beira da fonte para uma série de banhos. Tão benéficos lhe pareceram que voltou ano após ano e passou a recomendar aos doentes igual tratamento. Dessas barracas dos doentes de Dr. Lopes de Morais, nasceu o primeiro balneário do Luso

 Voltamos ao que Costa Simões  sobre o mesmo assunto nos diz no livro “Noticia dos Banhos do Luso” :

« A descoberta das suas virtudes therapeuticas deve-se a um médico d’aquelles sítios, assistente na Lameira de S. Pedro, José António de Moraes, clínico distincto……
Foi este médico, que para alli encaminhou os primeiros doentes em 1775, pouco mais ou menos. Fez os primeiros ensaios nas moléstias cutâneas; e ainda há noticia d’uma Anna d’Anadia, então criada de servir em Aguim, a quem estes banhos fizeram desapparecer alguns tubérculos da face, dizem que filhos de elephantíase dos gregos.

Por aquelle tempo fez cobrir os banhos de ramagem em forma de barraca; e, pouco depois, mandou construir pelos seus criados a primeira barraca de madeira. Ainda em 1848 morreu em Luso, de noventa e tantos anos, um dos criados, Manuel Galvão, que ajudou a este serviço.
…..
Em 1838 a camara municipal da Mealhada, com os recursos de que podia dispor, substituiu as barracas de madeira por uma casa de alvenaria.

 Se as informações de Costa Simões são verdadeiras, já eram mandados doentes a banhos para o Luso, 59 anos antes de o Dr. Lopes de Morais sair da prisão de Almeida.

 E continua a veia de historiador de Assis e Santos:
«Contou-me o meu avô, que nessa época, aí por 1870, Luso era apenas uma aldeia de 6 moradores!»
Mais uma vez, Costa Simões vem contrariar o que acima foi dito:


 Já 11 anos antes o número de moradores era de 273. A menos que tenha havido uma catástrofe nesse intervalo de tempo, a informação  de Assis e Santos está muito distante da realidade.

 E o nosso historiador remata assim a sua dissertação sobre Lopes de Morais:

« O notável jornalista Emídio Navarro impulsionou o desenvolvimento do Luso que lhe patenteou o reconhecimento público.

Mas o percursor da importante estância termal, de turismo e de veraneio, que agora o Luso é, foi o médico mortaguense que descobriu o valor curativo daquela antiquíssima fonte.

Esforçado cidadão e abalizado clínico, ele bem mereceu o reconhecimento do seu concelho.»

Estamos completamente de acordo quanto ao reconhecimento devido ao cidadão, ao médico e ao Professor de Medicina da Universidade de Coimbra, João Lopes de Morais. Acreditamos, no entanto, que ele dispensaria de bom grado as considerações fantasiosas do Dr. Assis.

 Sobre o Dr. Joaquim Tavares Festas, diz-nos o Dr. Assis:

  «O Dr. Joaquim Tavares Festas, foi no primeiro quartel do século XX um clínico esclarecido que durante 20 anos fez clínica em tantas dessas aldeias dispersas pela nossa vasta serrania. De estirpe fidalga, de inteligência invulgar, de alma nobre, dedicou-se sem interesse material, em completa abnegação, ao exercício da clínica rural. Ainda encontrei reminiscências da sua benemerência e proficiência.
Uma iniciativa sua teve êxito e perdurou no futuro.
Muitos doentes de Mortágua têm procurado no Caramulo o alívio para os seus males.
Mas poucos saberão que foi um médico de Mortágua que descobriu o valor do clima do Caramulo para o tratamento das doenças pulmonares, que foi uma doente de Mortágua a primeira a experimentá-lo, e que foi um carpinteiro de Mortágua a construir a casa de madeira nas Paredes do Guardão, onde  essa primeira doente fez a primeira cura de altitude no Caramulo.
E que daí nasceu a importante vila sanatorial que hoje existe, ilustrada por especialistas de grande reputação como foi o Dr. Tapia, por exemplo.»

 Sem querer de algum modo por em causa as qualidades técnicas e humanas do Dr. Joaquim Tavares Festas, que sabemos ter sido um médico estimado pelos habitantes de Mortágua, e respeitado até pelos seus adversários políticos, as palavras de Assis e Santos suscitam-nos alguns comentários:

 1 – “estirpe fidalga” -  Não conhecemos nada que confirme a sua origem fidalga. Sabemos que foi um defensor e representante dos monárquicos em Mortágua, mas de origem fidalga só temos conhecimento da sua cunhada, esposa de António Tavares Festas.

2-“ sem interesse material “- Joaquim Tavares Festas, pelo menos até 1906, era “médico de partido” e recebia do município a quantia de 200 000 réis por ano. Não temos uma noção real do que representa esta quantia.
3 –“ foi um médico de Mortágua que descobriu o valor do clima do Caramulo para o tratamento das doenças pulmonares”
Não existindo nessa época, medicamentos com alguma eficácia para o tratamento da tuberculose, no final do sec. XVIII e início do sec. XIX, os médicos recorreram aos sanatórios marítimos para  tratar estes doentes.
Em 1832 Francisco de Assis da Souza Vaz, defendeu na sua tese que apresentou em Paris a superioridade do clima da Madeira para tratar a tuberculose por associar a influência do mar e a altitude.
Na  década de 1840, George Bodington defendeu a criação de sanatórios de montanha, que só veio a acontecer em 1854 com a abertura dos primeiros sanatórios pelo Dr. Hermann Brehmer na Silésia alemã (Gorbersdorf) e Peter Dettweiler em 1876 em Falkenstein (Alemanha).
Num prefácio às crónicas de Emídio Navarro, publicadas em 1884, sobre uma expedição científica à serra da Estrela, realizada  no ano anterior, o médico Sousa Martins abordou a questão do tratamento da tuberculose pelo clima montanhoso e a necessidade de se construir um sanatório de montanha.
De uma expedição anterior, em 1881, já tinha resultado a construção de um Observatório meteorológico, que em 1882  acomodou o primeiro doente, Alfredo César Rodrigues, amigo de Sousa Martins. Em seguida mandou construir uma residência própria, e dois anos depois declarou-se curado.
Ainda foram construídas algumas habitações de madeira, mas os doentes não tinham o apoio médico e logístico necessário.

O primeiro  sanatório de altitude viria a ser construído na cidade da Guarda. Os terrenos foram comprados em 1901, mas só foi concluído e inaugurado em 1907, com a presença da família real.
Como facilmente se percebe, Joaquim Tavares Festas não descobriu coisa nenhuma. Como médico bem informado das tendências terapêuticas do seu tempo, utilizou os meios de que dispunha para tentar tratar uma paciente que lhe era querida.

 4- foi uma doente de Mortágua a primeira a experimentá-lo. Na realidade a doente era a esposa de seu irmão, João Tavares Festas, que foi acometida pela terrível doença

5- a casa de madeira nas Paredes do Guardão …E que daí nasceu a importante vila sanatorial que hoje existe, ilustrada por especialistas de grande reputação como foi o Dr. Tapia, por exemplo.”.

A disponibilidade económica familiar permitiu que fosse construída uma casa de madeira nas Paredes de Guardão, à semelhança do que  existia na Suiça e onde a paciente pode aproveitar as vantagens da altitude. A família ainda hoje tem um serviço de louça com a imagem dessa casa de Guardão.

Em 1922, a Sociedade do Caramulo, constituída por Jerónimo Lacerda, construiu um Hotel que seria o início de uma estrutura que atingiria quase duas dezenas de sanatórios, dotada de todas as infra-estruturas necessárias ao seu bom funcionamento.
Se Jerónimo Lacerda se inspirou em Joaquim Tavares Festas, não o podemos afirmar nem negar.

Quanto ao Dr. Tápia, ilustre tisiologista espanhol, chegou a Portugal fugido da Guerra de Espanha e do ditador Franco.

 A descoberta  de medicamentos eficazes contra o bacilo da tuberculose, levou a que fosse abandonado tratamento nos sanatórios de montanha, que hoje se encontram abandonados.
A Estreptomicina foi descoberta em 1944, e a eficácia da Isoniazida só foi demonstrada em 1945, apesar de o medicamento já ser conhecido em 1912.

 
A dissertação do Dr Assis relativa aos médicos de Mortágua termina de modo deveras surpreendente:

 «O Dr. Teixeira Gordo foi uma personalidade bastante diferente. Distinguiu-se não pela clínica de aldeia, mas pela ascensão ao professorado universitário.
Uma obra importante ficou a assinalar a sua passagem pelo mundo – a estrada de Vila Moinhos, construída há cerca de 90 anos.
Talvez o lente da Universidade tivesse interesse pessoal na abertura dessa estrada, mas ficaram beneficiadas para sempre, as povoações do Reguengo e foi esse o ponto de partida para a estrada do Caramulo. Apenas uma fotografia recorda, na casa de Vila Moinhos que foi dele, a sua existência.»

Não conseguimos apurar se é verdadeira a sua influência na construção da referida estrada.
Mas ficamos com a certeza que o Dr. José Feliciano da Fonseca Teixeira Gordo  nunca foi médico.
Em 1915 “ Jose Feliciano da Fonseca Teixeira Gordo , filho de Manoel Gomes André , natural de Villa Moinhos , Comarca de Viseu” estava matriculado no quarto ano de Leis ** da Universidade de Coimbra, conforme consta da “ Relação e Indice Alfabético dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1815 para 1816”.
** A Faculdade de Leis existiu até 1836. Em 5 de Dezembro de 1836, foi publicado um Decreto que fundiu na Faculdade de Direito as faculdades de Cânones e de Leis.

Consultamos o livro MEMORIA PROFESSORUM UNIVERSITATIS CONIMBRICENSIS , 1772-1937, VOL.II. Direcção: Manuel Augusto Rodrigues.  Arquivo da Universidade de Coimbra. Coimbra 1992, que nos informou:
“GORDO, José Feliciano da Fonseca Teixeira

Naturalidade – Vila Meã (Sobral, Mortágua), 26.8.1793 – Coimbra, 14.11.1867.

Filiação – Manuel André e Maria Rodrigues da Fonseca.

Matrículas – 31.12.1812

Graus – Bacharel, 11.6.1816. Licenciado, 26.6.1818, Doutor, 12.7.1818

Cadeiras – História do Direito Romano e Pátrio (1830-1834), 2º substituto.

Observações – Abandonou a Universidade em 1834, por não querer aceitar o regime liberal.”

Quanto a este abandono da Universidade, José Adelino Maltez, dá-nos uma achega em texto intitulado Saneamento de Professores, publicado  em maltez.info/aaanetnovabiografia/Conceitos/Saneamento%20de%20Professores.htm

“……Em 15 de Julho de 1834 eram demitidos inúmeros doutores em direito: Alexandre Dias Pessoa, Bernardo José de Carvalho, António Caetano de Sousa Faria Lobo Girão, Miguel Gomes Soares, Cândido Rodrigues Alves de Figueiredo e Lima, José Pedro Moniz de Figueiredo, António Vasconcelos e Sousa, José Maria de Lima e Lemos, José Lopes Galvão, Joaquim José Pais da Silva, José Feliciano da Fonseca Teixeira*, Francisco Lebre de Vasconcelos, Joaquim Maria Taborda Falcão Tavares.

Por decreto do dia anterior nomeiam-se Basílio Alberto de Sousa Pinto, Manuel António Coelho da Rocha, José Machado de Abreu, Francisco Maria Tavares de Carvalho, Frederico de Azevedo Faro Noronha e Meneses, António Nunes de Carvalho.

Os pedristas demitem os miguelistas, tal como antes os apostólicos haviam demitido os liberais. …. “

*O autor, provavelmente de modo involuntário, omitiu o sobrenome Gordo.

Pelo que nos diz José Adelino Maltez, o abandono não foi propriamente voluntário.

 Nota: Encontramos uma discrepância nos livros que citamos quanto ao local de nascimento do Dr. Teixeira Gordo, ora Vila Moinhos, ora Vila Meã, que ainda não tivemos oportunidade de esclarecer.

quinta-feira, 7 de julho de 2016


Carta de Foral de 1192

Um amigo fez-nos chegar à mão uma versão dactilografada, e  já vertida para um português mais recente, que pensamos ser interessante divulgar.  Dado, que mesmo com uma grafia actualizada, são utilizados termos que caíram em desuso, ou são hoje pouco usados, acrescentamos algumas notas para permitir uma melhor compreensão do texto. Esperamos que  vos agrade conhecer este documento histórico de Mortágua.

 «Carta de Foral, concedida a Mortágua em 1192,
existente no Fundo da Colegiada de S. Cristóvão de Coimbra do Arquivo Público

 Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Ámen. Eu, Dulce, Rainha de Portugal por graça de Deus, faço, por autoridade e mandato do Rei D. Sancho e de meus filhos e filhas, uma carta de foral a todos aqueles homens de Mortágua que ali habitam e venham a povoá-la. Dou-lhes por foro que o homem que cometa furto pague nove por um, e fique o seu corpo na posse do senhor da terra. Quem cometer homicídio pague 60 soldos. Quem fizer rousso1 pague 60 soldos. Quem puser merda na boca de um homem-bom2, para o insultar pague 60 soldos. Quem fizer sangue com ferro mudo3 a um homem-bom, com vozearia, e for descoberto, pague 30 soldos. Que puxar de armas devido a ira, mas não acometer com elas, perca a arma. Quem levar à força um penhor ao criado de um homem-bom, perca o penhor que lhe levou. Quem matar um criado pague 12 maravedis 4, e fique o seu corpo no poder do senhor da terra. Quem atacar um saião 5 andador 6 pague seis maravedis. Quem matar um juiz pague 12 maravedis. Darão de jugada de um casal um módio terçado: a terça parte de trigo, a terça de milho, e a terça de aveia. Os serviçais darão, por sua vez, uma teiga 7. Darão por ano, do foro do reguengo do Soveral, duas fogaças de almude 8 e dois capões. Quem tiver espádua 9 da-la-á com um capão, e se não a tiver dará dois capões. Quem tiver uma vinha e depois mandar as uvas ao lagar dará uma décima parte. Quem quiser manter o imposto de cavalaria, assim o faça. E se não o quiser, dê a jugada10. O almocreve que viver da almocrevaria faça antes uma caminhada por ano. O peão de Mortágua faça o caminho diário, a mandado do seu senhor, e faça também o seu fossado 11. Quem vender a sua herdade ou sua fazenda, dê o dízimo do preço ao senhor da terra, e venda-a a um homem que pratique foro semelhante. Darão as portagens por seu foro, conforme os costumes da terra. Pagarão foro de todas as outras herdades que estão no termo de Mortágua. Quem lavrar uma herdade de outro casal dará a quinta parte. O homem que quiser afastar-se e ir habitar para outra terra, despache-se perante o juiz pelo S. João, e vá-se até à festa de S. Miguel. Os homens malfeitores ou sandeus12 ficarão sob o poder do senhor da terra. Se a rainha descobrir que alguma coisa, por esquecimento, não conste dos seus foros, faça inquirição, sem o que não será feita esta carta. Quem invadir a casa de qualquer homem-bom de Mortágua e ali for descoberto, pague 60 soldos. Que entrar por ira, sem qualquer criado, duplique o que dali desviou. Quem observar esta carta tenha a bênção de Deus. Esta carta fez-se no mês de Setembro da era de 1230 (1192). Eu, Dulce, acima nomeada, que mandei fazer esta carta por mandato do Rei D. Sancho e de meus filhos e filhas, roboro-a 13 na presença destes homens e aponho-lhe este sinal. Estiveram presentes Gonçalo Mendes, Mordomo da Corte. D. João Fernandes, Alcaide de Coimbra. Rui Mendes, Porta-Estandarte. D. Julião, Chanceler do Rei. Raimundo Eanes, Pero Gomes. O Rei D. Sancho confirma-a. A Rainha D. Dulce confirma-a. O Rei (Infante) D. Afonso confirma-a. O Rei (Infante) D. Pedro confirma-a. O Rei (Infante) D. Fernando confirma-a. A Rainha (Infanta) D. Sancha confirma-a, e as outras filhas confirmam-na. Pero Soares, Bispo de Coimbra. Estêvão Martins, Alvazil 14  de Coimbra. Mestre Mendo, médico do Rei. Pedro, presbítero, escrivão. A Rainha. »

 

 Notas :

1  Violação

2  Habitantes com relevância social, por possuírem bens, ou por exercerem ofícios não manuais.

3 “Ferro moludo , ou ferro mudo. O mesmo que Ferro moído. E chamárão-lhe assim, porque as ferramentas são trabalhadas na mó,ou pedra de affiar muito bem , primeiro que hajão de servir. E por isso ainda hoje dizemos Amolar, por aguçar , ou affiar na mó, ou outra pedra , que adelgace os instrumentos de cortar , dividir , ou penetrar.

"Moeda de ouro, também chamada morabitino. Em Portugal as primeiras foram cunhadas no reinado de D. Sancho I.” (in Elucidario das palavras, termos , e frases, que antiguamente se usárão, e que hoje regularmente se ignorão . Joaquim de Santa Rosa Viterbo 1798)

5  Carrasco. Verdugo, algoz.

6 Itinerante. Moço que leva recados

7 Antiga medida de secos, com diversos valores

 
 8 Um almude de trigo de Fogaça correspondia a 2 alqueires (Viterbo 1798)

9 “SPADOA. Entrecosto de porco. Era como se estipulava: de sete, de oito, de nove, de dez ou de doze costas, ou costelas. E outras vezes era «huma spadoa com todas sus costas». Assim conta de muitos prazos e arrendamentos do seculo XIII, XIV e XV.” (Viterbo 1798)

“ PRAZO. Obrigação, qualquer escritura, concerto, ajuste.” (Viterbo 1798)

10  Tributo cobrado pelo rei aos possuidores de certas terras, que consistia em determinada quantidade de frutos, na razão de cada jugo ou junta de boi com que o agricultor lavrava a terra, ou de pão. (Segundo Houaiss)

11 Serviço militar medieval cuja prestação respeitava normas estabelecidas pelo foral ou pelo costume da terra

 
12  Estúpido, idiota, imbecil, pateta, mentecapto.
(A palavra sandeu tem origem na exclamação "Santo Deus!" in Blog Língua à portuguesa. S.Duarte e S.Leite)

 
13 "Roborar- firmar de novo, confirmar por um instrumento publico o que já tinha sido dito " (Viterbo 1798)

14 Juiz ordinário, e que decidia as causas na primeira Instancia , admittindo Appellação , e aggravo nos casos, que a Lei o permittia.” (Viterbo 1798)

Vereador da Camera. Nesta accepção he frequente , desde El-Rei D. Sancho I. até El-Rei D. João I. , e mesmo por qualquer outro Official do Concelho” (Viterbo 1798)

terça-feira, 5 de julho de 2016


Corpos dirigentes do Partido Republicano Português no Concelho de Mortágua em 1910

Comissão Municipal

Effectivos:
Augusto Simões Neves de Souza
Aureliano Xavier de Souza Maia
Albano de Morais Lobo
António Lourenço Ferreira
José Ferreira Affonso

Substitutos:
António de Souza e Silva
João Martins
Joaquim Penella
José Thomaz da Fonseca
Severino Miragaya

 
Comissões Parochiaes

Cortegaça
Effectivos:

Antonio d’Oliveira
Adelino Martins Almeida
José Lopes Coelho

Substitutos:
Antonio dos Santos
Joaquim Marques
José Gomes

 Espinho

Effectivos:
Augusto Ferreira
Alípio Gomes
Candido da Costa
Manuel d’Almeida Queiró
Silvino da Silva e Souza

Substitutos:
António Duarte
António Lopes Vieira
Antonio Alvaro das Neves
Cypriano Mendes
José Paes

 
Marmelleira

Effectivos:
Abílio Pereira de Souza
Joaquim Lopes Pereira
José de Mattos
José Caetano Ferreira
Julio da Silva Neves

Substitutos:
Antonio da Silva Neves
Bazílio Ferreira
Eduardo Ferreira
Joaquim Marques Victorio
Joaquim Lopes Pereira

 Mortagua
Effectivos:
Anacleto Gouveia Nobre
José Fernandes d’Oliveira
José Fernandes Junior
José Maria de Mello
José David Mendes

Substitutos:
Albino Martins d’Oliveira
José Simões Nunes
José Rosa
Manuel Fernandes d’Oliveira
Manuel Simões Nunes

 Palla
Effectivos:
Augusto Cezar Thomaz
Francisco Simões Ferreira
José Pereira
Manuel Rodrigues dos Santos
Silvestre Ferreira

Substitutos:
Adelino Fernandes
Albino Marques
Francisco Gomes de Moraes
José Pereira Junior
José Dias

 
Sobral
Effectivos:
Florencio de Mattos
José Martins
José Henriques Nunes
José Lourenço Thomé
Manuel Ferraz

Substitutos:
Augusto Ferreira Albino
Alípio Ferreira
José Martins de Almeida
José Martins
José Gomes

 Trezoy
Effectivos:
Abel Affonso
Joaquim Maurício
Manuel Gomes Florindo

Valle de Remigio
Effectivos:
Augusto Lopes Pinto
Henrique d’Almeida Maia
José Thomaz
Manuel Silverio Marques
Manuel Martins Baptista

Substitutos:
António Augusto Gaspar
Antonio Duarte
Adelino João
Abilio Rosa da Luz
Seraphim Marques

 
Transcrição de “Annuario Democratico” , de Gomes de Carvalho e Jayme de Souza Sabrosa. Lisboa, 1910, utilizando a grafia original.
 

 
 
 
Marmeleira e Tradição Republicana
 
 
A Marmeleira foi uma aldeia com grande ligação aos ideais da República. A prova disso é que em 1910 já existia na Marmeleira um dos dois Centros Republicanos do Distrito de Viseu, quando nem na sede do Concelho existia algum.
Isso mesmo está documentado no Annuario Democrático , de 1910, que aqui reproduzimos.
 
 
 
 


 
Infelizmente, o Annuario Democratico, não nos dá informação sobre os corpos gerentes.

domingo, 3 de julho de 2016


Fundação do Centro Democrático de Educação Popular, da Marmeleira


Há pouco mais  de 2 anos, por especial deferência de Eurico Tomás, tive acesso ao espólio de António Lopes de Araújo, e encontrei, entre muitos documentos, a acta da constituição do Centro Democrático de Educação Popular da Marmeleira, manuscrita por Basílio Lopes Pereira. Sei que o livro de actas foi entretanto entregue  por Eurico Tomás, ao novo museu que ali se constituiu. Já tive oportunidade de o ver exposto numa vitrina. Mas, porque entendo que um documento dessa importância deve poder ser acedido por quem se interesse pelo estudo destes assuntos, e não ser mais um objecto de decoração, decidi publicar uma cópia do documento a que tive acesso, mantendo a grafia original.
Espero, sinceramente, com esta publicação contribuir para que se digam menos  disparates ou declaradas mentiras sobre a  aldeia da Marmeleira, cuja riqueza histórica dispensa falsidades.

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Livro de actas
do
“Centro Democratico de Educação Popular”
Da Marmeleira (Mortágua)

1912

Termo de abertura

Neste livro vão ser lançadas todas as actas dos organismos do Centro Democratico de Educação Popular da Marmeleira(Mortágua) e, por esse motivo, conforme a deliberação tomada na primeira reunião da Comissão Fundadora, vão ser todas as suas folhas numeradas e rubricadas pelo presidente da dita reunião, que também assignará este termo.

Marmeleira, 25 de Setembro de 1912.

O Presidente da reunião

( Nota: O Termo de abertura não está assinado, e as folhas não estão numeradas nem assinadas)

Actas

Aos vinte e cinco dias do mez de Setembro de mil nove centos e doze compareceram, em casa do Sr. Joaquim Lopes Pereira, e com este, os Srs. Francisco Nunes Cordeiro, João Pereira de Sousa (da Marmeleira), Julio Baptista dos Reis, Manuel Soares Oliveira, Serafim Lopes Pereira, Luciano Ferreira dos Reis, José Luiz Gonzaga e Basílio Lopes Pereira. Fez uso da palavra o Sr. Serafim Lopes Pereira para convidar a presidir à sessão, que se ia efectuar, o Sr. João Pereira de Sousa que por sua vez, convidou a secretarial-o o Sr. Basílio Lopes Pereira.
Depois de aprovadas, unanimemente, as escolhas feitas, Basilio Lopes Pereira disse que estava na memoria de todos a tentativa infrutífera , levada a efeito em 1908, no intuito de fundar uma associação de instrução e educação popular a que, então, se havia dado o nome de Biblioteca Marmeleirense e que, por conselho do ilustre professor do Liceu Central de Viseu, Sr. dr. Lopes de Oliveira, se substituira por Biblioteca Popular, denominação mais definidamente característica. Disse mais que se tornava necessário, apesar do insucesso dos primeiros esforços para os tão carinhosamente haviam contribuído, entre outros, e que é de justiça ali recordar, os senhores José de Matos e José Caetano Ferreira, o primeiro nomeado secretario da comissão que então se constituira, tentar, de novo, fazer triunfar essa simpática iniciativa. É da maior vantagem para o progresso da freguesia da Marmeleira e de toda a região vizinha a constituição d’um centro educativo que não só mostre todas as inúmeras utilidades que podem advir da instrução e da educação, mas ainda, e muito principalmente, ampare os alunos das escolas no momento em que tenham de abandonal’as. Correrão o perigo de esquecer, em breve tempo, tudo quanto os professores se tenham esforçado por lhes ensinar, se não tiverem facilidade em encontrar uma certa assistência intelectual que os oriente e lhes proporcione leituras uteis, de modo a não perderem a curiosidade de saber. Será ociosidade repetir ali todas as razões que aconselham a  fundação de semelhante instituição, e por isso, vai fazer uma proposta que procurará sintetizar o seu programa que, por honra de todos os presentes, será unanimemente aprovada. Diz confiar, absolutamente, no muito amor, que todos os que ali estão nutrem pela sua terra. Ninguem, de certo, regateará um pouco do seu esforço, na medida das forças de cada um, para o bem de todos, para o desenvolvimento económico e moral da sua terra, desenvolvimento esse que só poderá conseguir-se, assentando na instrução e na educação do povo. Em seguida leu a proposta que vai adiante, e que o Sr. presidente poz à dicussão: «Proposta» -« Proponho,no interesse da Marmeleira e da sua região, que se emprehenda a fundação d’uma sociedade que traduza, por uma forma mais ampla, a tentativa feita em 6 de janeiro de 1908 com o fim de instituir uma “Biblioteca Popular” e que essa sociedade, tomando a denominação de “Centro Democrático de Educação Popular” assente nos moldes seguintes: 1º) Como fim geral, propor-se promover o progresso moral, cívico e material do povo, desenvolvendo a instrução e a educação popular, e, como particular e especial, crear e sustentar uma “Biblioteca Popular”, desenvolver a instrução agricola, como a mais útil aos seus futuros sócios, e procurar que todos os ex-alunos das escolas primarias, solicitando para isso o auxilio dos seus professores, garantindo, quanto possível, todos os ensinamentos ministrados por estes, continuem a sua cultura intelectual, frequentando a Biblioteca e assistindo às conferencias e palestras que se deverão realizar; 2º) O “Centro” envidará todos os esforços por que se funde um sindicato agricola, uma caixa de credito agricola e uma sociedade de seguros mútuos de gado; 3º) Realizará, além de conferencias e palestras, passeios de estudo e festas de instrução, devendo merecer-lhe especial cuidado a festa da arvore para o que procurará a cooperação das escolas locais; 4º) O “Centro” também creará diversos cursos regulares, especialmente, um curso de instrução primária para analfabetos». Depois de ligeira discussão, foi aprovada por unanimidade, na generalidade, divergindo, quanto a conseguir-se a sua efectivação, o Sr. João Pereira de Sousa que disse que era muita coisa para se podesse realizar tudo, mas que estava prompto a contribuir também para que alguma coisa se fizesse. O Sr. João Pereira de Sousa comunicou o oferecimento feito pelo Sr. José de Matos, que oferece a sua casa para instalar, desde já, o Centro Democrático de Educação Popular e a sua Biblioteca Popular, oferecimento que foi aceite, votando-se, por unanimidade, um voto de reconhecido agradecimento. Deliberou-se que se tomassem todas as providencias no sentido de abrir definitivamente ao publico, a Biblioteca no dia 12 do próximo mez de Outubro. Por proposta de Julio Baptista dos Reis determinou-se fazer a aquisição d’um livro para actas que seja numerado e rubricado pelo presidente da reunião e que o secretario seja encarregado de as lavrar. O Sr. Francisco Nunes Cordeiro propoz que se votassem  votos de agradecimento aos Srs. Carlos de Lemos, distintíssimo professor do liceu de Viseu; dr. Pereira Vitorino  e José Perdigão, deputados; Tomas da Fonseca, professor e director da Escola Normal de Lisboa; e dr. Lopes de Oliveira, também professor do liceu, pelas valiosas ofertas de livros, que fizeram, quando da tentativa de 1908, e que vão constituir a base da Biblioteca Popular do novo Centro. Foram aprovados por unanimidade, sendo, igualmente, aprovado, pelo mesmo motivo, um voto também de agradecimento ao Sr. Augusto Simões Nunes de Sousa. Em seguida por proposta do Sr. Joaquim Lopes Pereira foi eleita uma Direcção do “Centro Democratico de Educação Popular” que toma, a seu cargo, todos os trabalhos respeitantes á organização e funcionamento da nova sociedade, promova a aquisição de sócios e de livros e trate de elaborar uns estatutos para serem aprovados pela autoridade. A eleição recaiu nos seguintes senhores: João Pereira de Sousa, Julio Baptista dos Reis, Francisco de Almeida e Silva, Manuel Soares de Oliveira e Basilio Lopes Pereira, este como secretario. A nova Direcção tomou em seguida posse depois do que foi encerrada a sessão.

Marmeleira, 25 de Setembro de 1912. Foi aprovada a presente acta pela Comissão Fundadora que a vai assinar.

João Pereira de Sousa
Joaquim Lopes Pereira
Francisco Nunes Cordeiro
Julio Baptista dos Reis
Manoel Soares Oliveira
Serafim Lopes Pereira
José Luiz Gonzaga
Luciano Ferreira dos Reis
Basilio Lopes Pereira, Secretário

Nota: Existe só uma acta no livro, e, exceptuando as assinaturas de Serafim e de Basílio, os outros nomes inscritos no documento estão escritos a lápis pelo secretário, Basílio Lopes Pereira.