Fundação do Centro Democrático de Educação Popular, da Marmeleira
Há
pouco mais de 2 anos, por especial
deferência de Eurico Tomás, tive acesso ao espólio de António Lopes de Araújo,
e encontrei, entre muitos documentos, a acta da constituição do Centro
Democrático de Educação Popular da Marmeleira, manuscrita por Basílio Lopes
Pereira. Sei que o livro de actas foi entretanto entregue por Eurico Tomás, ao novo museu que ali se
constituiu. Já tive oportunidade de o ver exposto numa vitrina. Mas, porque
entendo que um documento dessa importância deve poder ser acedido por quem se
interesse pelo estudo destes assuntos, e não ser mais um objecto de decoração,
decidi publicar uma cópia do documento a que tive acesso, mantendo a grafia
original.
Espero, sinceramente, com esta publicação contribuir para que se digam menos disparates ou declaradas mentiras sobre a aldeia da Marmeleira, cuja riqueza histórica dispensa falsidades.
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* *
Livro de
actas
do
“Centro
Democratico de Educação Popular”
Da
Marmeleira (Mortágua)
1912
Termo de
abertura
Neste
livro vão ser lançadas todas as actas dos organismos do Centro Democratico de
Educação Popular da Marmeleira(Mortágua) e, por esse motivo, conforme a
deliberação tomada na primeira reunião da Comissão Fundadora, vão ser todas as
suas folhas numeradas e rubricadas pelo presidente da dita reunião, que também
assignará este termo.
Marmeleira,
25 de Setembro de 1912.
O Presidente da reunião
(
Nota: O Termo de abertura não está assinado, e as folhas não estão numeradas nem
assinadas)
Actas
Aos vinte e cinco dias do mez de
Setembro de mil nove centos e doze compareceram, em casa do Sr. Joaquim Lopes
Pereira, e com este, os Srs. Francisco Nunes Cordeiro, João Pereira de Sousa
(da Marmeleira), Julio Baptista dos Reis, Manuel Soares Oliveira, Serafim Lopes
Pereira, Luciano Ferreira dos Reis, José Luiz Gonzaga e Basílio Lopes Pereira.
Fez uso da palavra o Sr. Serafim Lopes Pereira para convidar a presidir à
sessão, que se ia efectuar, o Sr. João Pereira de Sousa que por sua vez,
convidou a secretarial-o o Sr. Basílio Lopes Pereira.
Depois de aprovadas, unanimemente, as
escolhas feitas, Basilio Lopes Pereira disse que estava na memoria de todos a
tentativa infrutífera , levada a efeito em 1908, no intuito de fundar uma
associação de instrução e educação popular a que, então, se havia dado o nome
de Biblioteca Marmeleirense e que, por conselho do ilustre professor do Liceu
Central de Viseu, Sr. dr. Lopes de Oliveira, se substituira por Biblioteca
Popular, denominação mais definidamente característica. Disse mais que se
tornava necessário, apesar do insucesso dos primeiros esforços para os tão
carinhosamente haviam contribuído, entre outros, e que é de justiça ali
recordar, os senhores José de Matos e José Caetano Ferreira, o primeiro nomeado
secretario da comissão que então se constituira, tentar, de novo, fazer
triunfar essa simpática iniciativa. É da maior vantagem para o progresso da freguesia
da Marmeleira e de toda a região vizinha a constituição d’um centro educativo
que não só mostre todas as inúmeras utilidades que podem advir da instrução e
da educação, mas ainda, e muito principalmente, ampare os alunos das escolas no
momento em que tenham de abandonal’as. Correrão o perigo de esquecer, em breve
tempo, tudo quanto os professores se tenham esforçado por lhes ensinar, se não
tiverem facilidade em encontrar uma certa assistência intelectual que os
oriente e lhes proporcione leituras uteis, de modo a não perderem a curiosidade
de saber. Será ociosidade repetir ali todas as razões que aconselham a fundação de semelhante instituição, e por
isso, vai fazer uma proposta que procurará sintetizar o seu programa que, por
honra de todos os presentes, será unanimemente aprovada. Diz confiar,
absolutamente, no muito amor, que todos os que ali estão nutrem pela sua terra.
Ninguem, de certo, regateará um pouco do seu esforço, na medida das forças de
cada um, para o bem de todos, para o desenvolvimento económico e moral da sua
terra, desenvolvimento esse que só poderá conseguir-se, assentando na instrução
e na educação do povo. Em seguida leu a proposta que vai adiante, e que o Sr.
presidente poz à dicussão: «Proposta» -«
Proponho,no interesse da Marmeleira e da sua região, que se emprehenda a
fundação d’uma sociedade que traduza, por uma forma mais ampla, a tentativa
feita em 6 de janeiro de 1908 com o fim de instituir uma “Biblioteca Popular” e
que essa sociedade, tomando a denominação de “Centro Democrático de Educação
Popular” assente nos moldes seguintes: 1º)
Como fim geral, propor-se promover o progresso moral, cívico e material do
povo, desenvolvendo a instrução e a educação popular, e, como particular e
especial, crear e sustentar uma “Biblioteca Popular”, desenvolver a instrução
agricola, como a mais útil aos seus futuros sócios, e procurar que todos os
ex-alunos das escolas primarias, solicitando para isso o auxilio dos seus
professores, garantindo, quanto possível, todos os ensinamentos ministrados por
estes, continuem a sua cultura intelectual, frequentando a Biblioteca e
assistindo às conferencias e palestras que se deverão realizar; 2º) O “Centro” envidará todos os esforços por
que se funde um sindicato agricola, uma caixa de credito agricola e uma
sociedade de seguros mútuos de gado; 3º) Realizará, além de conferencias e
palestras, passeios de estudo e festas de instrução, devendo merecer-lhe
especial cuidado a festa da arvore para o que procurará a cooperação das
escolas locais; 4º) O “Centro” também creará diversos cursos regulares,
especialmente, um curso de instrução primária para analfabetos». Depois de
ligeira discussão, foi aprovada por unanimidade, na generalidade, divergindo,
quanto a conseguir-se a sua efectivação, o Sr. João Pereira de Sousa que disse
que era muita coisa para se podesse realizar tudo, mas que estava prompto a
contribuir também para que alguma coisa se fizesse. O Sr. João Pereira de Sousa
comunicou o oferecimento feito pelo Sr. José de Matos, que oferece a sua casa para
instalar, desde já, o Centro Democrático de Educação Popular e a sua Biblioteca
Popular, oferecimento que foi aceite, votando-se, por unanimidade, um voto de
reconhecido agradecimento. Deliberou-se que se tomassem todas as providencias
no sentido de abrir definitivamente ao publico, a Biblioteca no dia 12 do
próximo mez de Outubro. Por proposta de Julio Baptista dos Reis determinou-se
fazer a aquisição d’um livro para actas que seja numerado e rubricado pelo
presidente da reunião e que o secretario seja encarregado de as lavrar. O Sr.
Francisco Nunes Cordeiro propoz que se votassem
votos de agradecimento aos Srs. Carlos de Lemos, distintíssimo professor
do liceu de Viseu; dr. Pereira Vitorino
e José Perdigão, deputados; Tomas da Fonseca, professor e director da
Escola Normal de Lisboa; e dr. Lopes de Oliveira, também professor do liceu,
pelas valiosas ofertas de livros, que fizeram, quando da tentativa de 1908, e
que vão constituir a base da Biblioteca Popular do novo Centro. Foram aprovados
por unanimidade, sendo, igualmente, aprovado, pelo mesmo motivo, um voto também
de agradecimento ao Sr. Augusto Simões Nunes de Sousa. Em seguida por proposta
do Sr. Joaquim Lopes Pereira foi eleita uma Direcção do “Centro Democratico de
Educação Popular” que toma, a seu cargo, todos os trabalhos respeitantes á
organização e funcionamento da nova sociedade, promova a aquisição de sócios e
de livros e trate de elaborar uns estatutos para serem aprovados pela
autoridade. A eleição recaiu nos seguintes senhores: João Pereira de Sousa,
Julio Baptista dos Reis, Francisco de Almeida e Silva, Manuel Soares de
Oliveira e Basilio Lopes Pereira, este como secretario. A nova Direcção tomou
em seguida posse depois do que foi encerrada a sessão.
Marmeleira,
25 de Setembro de 1912. Foi aprovada a presente acta pela Comissão Fundadora
que a vai assinar.
João
Pereira de Sousa
Joaquim
Lopes Pereira
Francisco
Nunes Cordeiro
Julio
Baptista dos Reis
Manoel
Soares Oliveira
Serafim Lopes Pereira
José
Luiz Gonzaga
Luciano
Ferreira dos Reis
Basilio Lopes Pereira, Secretário
Nota: Existe só uma acta no livro, e,
exceptuando as assinaturas de Serafim e de Basílio, os outros nomes inscritos no
documento estão escritos a lápis pelo secretário, Basílio Lopes Pereira.
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