domingo, 3 de julho de 2016


Fundação do Centro Democrático de Educação Popular, da Marmeleira


Há pouco mais  de 2 anos, por especial deferência de Eurico Tomás, tive acesso ao espólio de António Lopes de Araújo, e encontrei, entre muitos documentos, a acta da constituição do Centro Democrático de Educação Popular da Marmeleira, manuscrita por Basílio Lopes Pereira. Sei que o livro de actas foi entretanto entregue  por Eurico Tomás, ao novo museu que ali se constituiu. Já tive oportunidade de o ver exposto numa vitrina. Mas, porque entendo que um documento dessa importância deve poder ser acedido por quem se interesse pelo estudo destes assuntos, e não ser mais um objecto de decoração, decidi publicar uma cópia do documento a que tive acesso, mantendo a grafia original.
Espero, sinceramente, com esta publicação contribuir para que se digam menos  disparates ou declaradas mentiras sobre a  aldeia da Marmeleira, cuja riqueza histórica dispensa falsidades.

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Livro de actas
do
“Centro Democratico de Educação Popular”
Da Marmeleira (Mortágua)

1912

Termo de abertura

Neste livro vão ser lançadas todas as actas dos organismos do Centro Democratico de Educação Popular da Marmeleira(Mortágua) e, por esse motivo, conforme a deliberação tomada na primeira reunião da Comissão Fundadora, vão ser todas as suas folhas numeradas e rubricadas pelo presidente da dita reunião, que também assignará este termo.

Marmeleira, 25 de Setembro de 1912.

O Presidente da reunião

( Nota: O Termo de abertura não está assinado, e as folhas não estão numeradas nem assinadas)

Actas

Aos vinte e cinco dias do mez de Setembro de mil nove centos e doze compareceram, em casa do Sr. Joaquim Lopes Pereira, e com este, os Srs. Francisco Nunes Cordeiro, João Pereira de Sousa (da Marmeleira), Julio Baptista dos Reis, Manuel Soares Oliveira, Serafim Lopes Pereira, Luciano Ferreira dos Reis, José Luiz Gonzaga e Basílio Lopes Pereira. Fez uso da palavra o Sr. Serafim Lopes Pereira para convidar a presidir à sessão, que se ia efectuar, o Sr. João Pereira de Sousa que por sua vez, convidou a secretarial-o o Sr. Basílio Lopes Pereira.
Depois de aprovadas, unanimemente, as escolhas feitas, Basilio Lopes Pereira disse que estava na memoria de todos a tentativa infrutífera , levada a efeito em 1908, no intuito de fundar uma associação de instrução e educação popular a que, então, se havia dado o nome de Biblioteca Marmeleirense e que, por conselho do ilustre professor do Liceu Central de Viseu, Sr. dr. Lopes de Oliveira, se substituira por Biblioteca Popular, denominação mais definidamente característica. Disse mais que se tornava necessário, apesar do insucesso dos primeiros esforços para os tão carinhosamente haviam contribuído, entre outros, e que é de justiça ali recordar, os senhores José de Matos e José Caetano Ferreira, o primeiro nomeado secretario da comissão que então se constituira, tentar, de novo, fazer triunfar essa simpática iniciativa. É da maior vantagem para o progresso da freguesia da Marmeleira e de toda a região vizinha a constituição d’um centro educativo que não só mostre todas as inúmeras utilidades que podem advir da instrução e da educação, mas ainda, e muito principalmente, ampare os alunos das escolas no momento em que tenham de abandonal’as. Correrão o perigo de esquecer, em breve tempo, tudo quanto os professores se tenham esforçado por lhes ensinar, se não tiverem facilidade em encontrar uma certa assistência intelectual que os oriente e lhes proporcione leituras uteis, de modo a não perderem a curiosidade de saber. Será ociosidade repetir ali todas as razões que aconselham a  fundação de semelhante instituição, e por isso, vai fazer uma proposta que procurará sintetizar o seu programa que, por honra de todos os presentes, será unanimemente aprovada. Diz confiar, absolutamente, no muito amor, que todos os que ali estão nutrem pela sua terra. Ninguem, de certo, regateará um pouco do seu esforço, na medida das forças de cada um, para o bem de todos, para o desenvolvimento económico e moral da sua terra, desenvolvimento esse que só poderá conseguir-se, assentando na instrução e na educação do povo. Em seguida leu a proposta que vai adiante, e que o Sr. presidente poz à dicussão: «Proposta» -« Proponho,no interesse da Marmeleira e da sua região, que se emprehenda a fundação d’uma sociedade que traduza, por uma forma mais ampla, a tentativa feita em 6 de janeiro de 1908 com o fim de instituir uma “Biblioteca Popular” e que essa sociedade, tomando a denominação de “Centro Democrático de Educação Popular” assente nos moldes seguintes: 1º) Como fim geral, propor-se promover o progresso moral, cívico e material do povo, desenvolvendo a instrução e a educação popular, e, como particular e especial, crear e sustentar uma “Biblioteca Popular”, desenvolver a instrução agricola, como a mais útil aos seus futuros sócios, e procurar que todos os ex-alunos das escolas primarias, solicitando para isso o auxilio dos seus professores, garantindo, quanto possível, todos os ensinamentos ministrados por estes, continuem a sua cultura intelectual, frequentando a Biblioteca e assistindo às conferencias e palestras que se deverão realizar; 2º) O “Centro” envidará todos os esforços por que se funde um sindicato agricola, uma caixa de credito agricola e uma sociedade de seguros mútuos de gado; 3º) Realizará, além de conferencias e palestras, passeios de estudo e festas de instrução, devendo merecer-lhe especial cuidado a festa da arvore para o que procurará a cooperação das escolas locais; 4º) O “Centro” também creará diversos cursos regulares, especialmente, um curso de instrução primária para analfabetos». Depois de ligeira discussão, foi aprovada por unanimidade, na generalidade, divergindo, quanto a conseguir-se a sua efectivação, o Sr. João Pereira de Sousa que disse que era muita coisa para se podesse realizar tudo, mas que estava prompto a contribuir também para que alguma coisa se fizesse. O Sr. João Pereira de Sousa comunicou o oferecimento feito pelo Sr. José de Matos, que oferece a sua casa para instalar, desde já, o Centro Democrático de Educação Popular e a sua Biblioteca Popular, oferecimento que foi aceite, votando-se, por unanimidade, um voto de reconhecido agradecimento. Deliberou-se que se tomassem todas as providencias no sentido de abrir definitivamente ao publico, a Biblioteca no dia 12 do próximo mez de Outubro. Por proposta de Julio Baptista dos Reis determinou-se fazer a aquisição d’um livro para actas que seja numerado e rubricado pelo presidente da reunião e que o secretario seja encarregado de as lavrar. O Sr. Francisco Nunes Cordeiro propoz que se votassem  votos de agradecimento aos Srs. Carlos de Lemos, distintíssimo professor do liceu de Viseu; dr. Pereira Vitorino  e José Perdigão, deputados; Tomas da Fonseca, professor e director da Escola Normal de Lisboa; e dr. Lopes de Oliveira, também professor do liceu, pelas valiosas ofertas de livros, que fizeram, quando da tentativa de 1908, e que vão constituir a base da Biblioteca Popular do novo Centro. Foram aprovados por unanimidade, sendo, igualmente, aprovado, pelo mesmo motivo, um voto também de agradecimento ao Sr. Augusto Simões Nunes de Sousa. Em seguida por proposta do Sr. Joaquim Lopes Pereira foi eleita uma Direcção do “Centro Democratico de Educação Popular” que toma, a seu cargo, todos os trabalhos respeitantes á organização e funcionamento da nova sociedade, promova a aquisição de sócios e de livros e trate de elaborar uns estatutos para serem aprovados pela autoridade. A eleição recaiu nos seguintes senhores: João Pereira de Sousa, Julio Baptista dos Reis, Francisco de Almeida e Silva, Manuel Soares de Oliveira e Basilio Lopes Pereira, este como secretario. A nova Direcção tomou em seguida posse depois do que foi encerrada a sessão.

Marmeleira, 25 de Setembro de 1912. Foi aprovada a presente acta pela Comissão Fundadora que a vai assinar.

João Pereira de Sousa
Joaquim Lopes Pereira
Francisco Nunes Cordeiro
Julio Baptista dos Reis
Manoel Soares Oliveira
Serafim Lopes Pereira
José Luiz Gonzaga
Luciano Ferreira dos Reis
Basilio Lopes Pereira, Secretário

Nota: Existe só uma acta no livro, e, exceptuando as assinaturas de Serafim e de Basílio, os outros nomes inscritos no documento estão escritos a lápis pelo secretário, Basílio Lopes Pereira.
 

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