sexta-feira, 16 de junho de 2017


Um mortaguense na Patuleia
José de Gouveia e Sousa
 
Em 1846, reinava em Portugal D. Maria II e chefiava o governo cartista António Bernardo da Costa Cabral, quando a 16 de Maio surgiu um movimento popular no Minho que viria a ser conhecido por Revolução do Minho, ou da Maria da Fonte, ao que parece, por ter sido iniciado por uma Maria do lugar de Fontarcada.
O movimento era motivado pelo descontentamento popular em relação a novas leis de recrutamento militar e a alterações fiscais, mas a causa próxima foi a proibição de realizar enterros dentro das igrejas.

Em Coimbra foi criada uma junta governativa e organizou-se um batalhão de voluntários académicos.
Dessa movimentação resultou a demissão de Costa Cabral e a nomeação do Duque de Palmela para o substituir.
O batalhão académico foi prontamente desmobilizado.
Mas, a 6 de Outubro do mesmo ano, a rainha D. Maria II demite o duque de Palmela e nomeia o Duque de Saldanha para chefiar o Governo, numa manobra que foi chamada de Emboscada palaciana.
Logo se revoltou a cidade do Porto, e seguidamente grande parte do país, originando uma guerra civil, que ficou conhecida por Patuleia, e que durou oito meses, e que terminou com a intervenção de forças estrangeiras da chamada Quádrupla Aliança (Inglaterra, França, Espanha e Portugal), que impôs a paz com a assinatura da Convenção de Gramido, em 30 de Junho de 1847.
Em Coimbra, o Governador Civil, Duque de Loulé, ordenou a 11 de Outubro  a reorganização do Batalhão Académico, que de novo ficou sob as ordens de Fernando Eduardo Vasques da Cunha,  visconde de Maiorca.
As forças revoltosas foram derrotadas pelo Duque de Saldanha, em 22 de Dezembro de 1846, na Batalha de Torres Novas, e retiraram-se para o Porto.
Uma parte do Batalhão Académico partiu por mar, do Porto para o Algarve, e sob o comando do Visconde de Sá da Bandeira participou na batalha do Alto do Viso, a 1 de Maio de 1847, na zona de Setúbal.
As forças comandadas pelo Conde das Antas, incluindo a parte do batalhão académico que tinha permanecido no Porto e os que tinham voltado de Setúbal, 
 partiram do Porto a 31 de Maio de 1847, mas foram aprisionados à saída da barra pela esquadra inglesa.
Terminaria assim a participação do Batalhão Académico. No fim de Junho seria assinada a Convenção de Gramido.

Há algum tempo, mão amiga fez-nos chegar à mão um livrinho  da autoria do Dr. António dos Sanctos Pereira Jardim intitulado Notícia Histórica do Batalhão Académico de 1846-1847, publicado pela Imprensa da Universidade de Coimbra, em 1888. O autor faz um relato dos acontecimentos e publica a lista dos estudantes que participaram no Batalhão. Entre eles fomos encontrar um mortaguense. Passaremos a transcrever as passagens que lhe fazem alusão:
«153 José de Gouvêa e Sousa, 3ª companhia, natural de Vale de Açores, segundo ano de direito, nº90; fez toda a campanha. – Foi ferido na acção de Setúbal.»

Sobre a acção do Alto  do Viso:

«O posto dos académicos, durante o combate, deveria ser nos navios, porque, como já se disse, eles não pertenciam às tropas de desembarque; unicamente lhes fora cometida a polícia das guarnições dos mesmos navios. Os brios, porém, de que eles eram dotados, não lhes permitiam que, tendo eles sido os principais instigadores da acção que se ia travar, ficassem de braços cruzados dentro dos barcos, e não fossem os primeiros a afrontar os perigos no campo de batalha. Obtida de Salter, comandante da esquadrilha , a necessária licença, trinta e um académicos desembarcaram dos vapores e se apresentaram ao visconde de Sá, solicitando a honra de lhes ser dada a posição que ele entendesse ser de maiores perigos.
O visconde acolheu este pedido com inequívocos sinais de admiração, e colocou estes mancebos, que, com tanto denodo, faziam o sacrifício de seus futuros e de suas vidas, na vanguarda da ala esquerda do ataque, e lhes deu por comandante o capitão Fernando Mousinho de Albuquerque, um bravo, digno de comandar tão esforçados jovens.
Cabe aqui mencionar, já que não posso gravar em mármore, co letras de ouro, os nomes desses trinta e um valentes.
Manuel Fialho de Abreu Simões
José Maria Tavares Ferreira
Agostinho Pacheco Leite Bettencourt
António Alves de Macedo
D. António da Costa de Sousa de Macedo
António José de Barros e Sá
António Maria de Lemos
António dos Sanctos Pereira Jardim
Augusto José Gonçalves Lima
Augusto Zepherino Rodrigues
Ayres de Araújo Pereira Negrão
Caetano Xisto Moniz Barreto
Candido Maria Cau da Costa
Carlos Honório Borralho
Domingos António Ferreira
Eugénio Costa e Almeida
Francisco Pimentel de Macedo
Frederico Augusto Jansen Verdades
Guilherme Garcia de Sanct’Anna Miranda
João António de Macedo Ferraz
João António dos Sanctos e Silva
João Pereira Ramos Brun do Canto
João Ribeiro Barreira
Joaquim Guilherme de Seixas
Joaquim de Pinho e Sousa
José António Carlos Madeira Torres
José de Gouvêa e Sousa
Manuel Gomes Pinto
Manuel Ignacio Brun do Canto
Pedro Joyce
Raymundo Cesar Borges Teixeira»

 Mais adiante refere o autor:
« De volta a Setúbal, fez-se a chamada dos trinta e um académicos, que tinham entrado em combate. »
Não responderam à chamada cinco. Dois deles tinham morrido em combate ou em consequência dele. Outros dois foram aprisionados e assassinados. Sobre o quinto descreve António Jardim:

«- José de Gouvêa e Sousa. Foi recolhido no hospital de sangue com um ferimento no joelho, que recebeu no começo da acção. Era conhecido pelo cognome de “Conde das Antas”. Querendo, talvez, justificar os créditos de valente de que gozava o seu homónimo, não quis retirar-se do campo de batalha, quando foi ferido. Apertou com um lenço a ferida e continuou a bater-se como um leão até o fim da acção.»
O coronel Wilde conseguiu um cessar fogo da parte de ambos os beligerantes, podo termo à acção do Alto Viso.

«Os vinte e sete académicos, sobreviventes da acção do Alto do Viso, saíram de Setúbal no dia 19 de maio, embarcados nos vapores Mindelo e Porto. Apesar dos vapores terem chegado no dia 20 à barra do Porto, só puderam entrar e fundear no Douro em 21 do mesmo mês. Apenas foram lançados os ferros, desembarcaram os académicos e se encaminharam para o seu quartel.»
Não tardariam muito a iniciar uma nova aventura :
« No dia 28 todas as forças da expedição do conde das Antas, incluindo o Batalhão Académico, marcharam do Porto para a Foz, e aqui se demoraram até ao dia 30, em que se concluiu o embarque, sendo o estado maior da expediçaõ e o batalhão académico os últimos que embarcaram, já de noite.
No dia 31, ao romper da manhã, estava a esquadrilha da junta cercada de perto por uma poderosa esquadra, composta de vários vasos de guerra ingleses e de duas corvetas, uma francesa e outra espanhola.
…. O comandante desta esquadra era o comodoro Thomaz Maitland.»

 O comandante da expedição  foi intimado a entregar-se como prisioneiro de guerra, bem como as forças sob o seu comando, e não teve alternativa dada a desproporção dos meios.

« No dia 1 de Junho saíram das águas do Porto todos os vasos, tanto os aprisionados como os aprisionadores, exceptuando a fragata inglesa América, e fundearam nesse mesmo dia em frente da torre de S. Julião.»
O cativeiro nos navios e na torre de S. Julião durou trinta e nove dias.
A convenção de Gramido pôs fim a esta guerra civil.

De José de Gouvêa e Sousa, sabemos que no ano lectivo de 1849-1850 frequentava o 5º ano de Direito, e terá provavelmente terminado o curso.

Era filho de João António de Gouvêa e Frias.

quarta-feira, 14 de junho de 2017


Saul de Almeida - Pintor
 
A Igreja Matriz de Mortágua apresenta no seu teto uma pintura de Nossa Senhora da Assunção que foi executada pelo pintor Saul de Almeida, ajudado pelo seu discípulo mortaguense António Barbosa, de quem já falamos numa publicação anterior.
Da obra de Saul de Almeida, temos conhecimento de uma pintura com o tema “Quo Vadis” na Igreja Matriz de Cantanhede, e um fresco de S. Martinho na Igreja Matriz de Santo Varão.
 
Encontra-se representado no Museu Machado de Castro em Coimbra, pela sua pintura Casa da Nau.

Casa da Nau, 1934 Óleo sobre tela 48X34,5 cm. Saul Almeida. Museu Machado de Castro .In COSTA, Pedro F. M.P .da Providência e: A Cor do Centro Histórico de Coimbra. Imprensa da Universidade de Coimbra, 2012

segunda-feira, 12 de junho de 2017


VOLTANDO A ALFREDO CÂNDIDO
E A MORTÁGUA
 
Publiquei    algum tempo uma  notícia da passagem de Alfredo Cândido por Mortágua e dos desenhos que teria pintado de motivos mortaguenses, e do seu relato no jornal Defesa da Beira. Errei completamente quando entendi que teria sido uma exposição temporária de trabalhos de Alfredo Cândido, porque não dei a devida atenção ao que dizia a peça jornalística: “o artista que transformou o «viveiro» do Jardim-Escola João de Deus, de Mortágua, num viveiro de motivos regionais, paisagens que a nós nos parecem toscas, sem merecimento, sem interesse, mas que o artista, em pinturas maravilhosas, imprimiu ao amplo salão um formidável aspecto digno de admirar-se e nas quais as criancinhas hão de recrear o seu olhar curioso e ávido de coisas belas.

Se tivesse dado a conveniente atenção ao texto perceberia que era uma obra para permanecer no futuro - nas quais as criancinhas hão de recrear o seu olhar curioso e ávido de coisas belas.

A publicação da notícia teve a virtude de permitir que alguém, uma das tais criancinhas agora já avó, me informasse que as pinturas estavam no local original – na parede do jardim-escola João de Deus de Mortágua. As pinturas foram executadas num friso que abrange três paredes do salão central do jardim-escola. O tempo degradou algumas delas, mas na sua maioria, mantêm-se em bom estado. Constou-nos que teria sido feita uma intervenção no painel por um “habilidoso”, um tal Fernando Coelho, também conhecido por "Peixinho", que provavelmente nem saberia o que estava nas áreas que “restaurou”. Daí que algumas das coisas listadas no artigo da Defesa da Beira, deixaram de existir, ou se existem, não são reconhecíveis.
Pensamos conseguir reconhecer algumas
 
- Um trecho das vizinhanças do jardim-Escola;


- Um lavrador, com a sua junta de bois, a lavrar a terra;


 
- Rigueiras – vendo-se, ao fundo, os contrafortes do Caramulo, e, ao lado, um trecho da pitoresca «Quinta da Velha».




 
- Jardim público, com o respectivo coreto, que alguém classificou de monumento ao músico desconhecido;



- Açude à ponte de Vale de Açores, com o respectivo moinho;

 


- Ermida de Nossa Senhora de Fátima, acoitada pela gigantesca sobreira;

 


- Uma visita panorâmica do Cabeço do Senhor do Mundo, tendo, por fundo, a serra do Caramulo;



- Igreja de S. Gens, em Pala, vista do caminho da Palinha;



- A pitoresca ponte do Barril, tendo por fundo, o Barril de Cima;




- Uma rua de vale de Açores – casas típicas;



- Um trecho das eiras no alto do Outeiro;



-Um alpendre, no cimo do Cabeço, junto à capela do Senhor do Mundo;



- Ponte metálica do Caminho de Ferro, paralela á ponte de pedra, vista do Caneiro;



- Pelourinho de Mortágua;



- Um trecho da Rua de Trás, com todas as suas derrocadas;



- Um trecho do Chão de Calvos com a sua capela tradicional e entrada para o fontenário e ruínas da antiga casa da guarda;



- Casa na povoação da Gândara, onde nasceu D. Maria Isabel;



- Casa de residência do dr. Aníbal Dias e um recanto da sua entrada, onde se vê a legenda «Vila Maria Isabel»;



Não consegui identificar :

1 - Chafariz de Mortágua e edifício dos Paços do Concelho que lhe fica em frente;

2 - Ao centro – o Brasão de Mortágua.

Encontrei algumas imagens que não correspondem ao que está descrito


 
e uma zona degradada. Provavelmente terão sido objecto de intervenção pelo nosso pintor local, que tratou de alindar a zona degradada, sem saber o que lá estava anteriormente.

As fotografias que aqui apresento, não foram tiradas nas melhores condições. Penso que as pinturas mereciam a atenção de um fotógrafo profissional, até para servirem de informação a futuras intervenções de recuperação.

sábado, 10 de junho de 2017


ESCOLA LIVRE DE MORTÁGUA

TAÇA PORTUGAL- AMÉRICA

A Escola Livre de Mortágua foi criada em 9 de abril de 1919. Segundo os seus promotores não tinha objectivos políticos, pretendendo com a sua biblioteca, actividades desportivas,  conferências, etc., desenvolver a cultura, a educação física, e a formação moral e cívica da população. Levaram a cabo palestras com Lopes de Oliveira, Tomás da Fonseca e outros convidados ilustres , tiveram um grupo musical dirigido por António Ferreira Afonso, uma Secção de “Arte de representar”, abriram cursos dos três primeiros anos liceais, aulas práticas de Contabilidade e Escrituração comercial, entre outras iniciativas

Ao que tudo leva a acreditar, em 1927, a sua existência estaria práticamente resumida às actividades desportivas, em particular ao futebol, ao ciclismo e ao tiro de guerra civil. Em 1927, apesar da instauração da Ditadura Militar, foi tentada uma reorganização, em articulação com Escola Livre de Azeméis, no sentido de revitalizar as suas realizações e ampliar o seu campo de acção. Para isso contou com a colaboração de muita gente, que se dispunha a dinamizar a Escola Livre com o especial cuidado de manter neutralidade política e religiosa.

Em 24.04.1927 o jornal Correio de Mortágua anunciava :
 
“ Uma reorganização e um passeio.Vai ressurgir a Escola-Livre de Mortagua

A Escola – Livre de Mortágua vai ressurgir – tudo nos levando a crer que agora mais forte do que nunca.
Em boa verdade, não fazia sentido que Mortágua, a quem coube a honra de iniciar este movimento que agora se nota em prol das Escolas-Livres – continuadores do ensino recebido na escola primária -,tão desinteressada dele se mostrasse e permitisse que a sua Escola-Livre vivesse apenas pela Secção de Educação Física.
Ainda bem, portanto, que alguns devotados amigos da Escola-Livre e de Mortágua, se decidiram a reorganizá-la, colocando-a no lugar que lhe compete e insuflando-lhe vida para que ela possa atingir a sua finalidade: a cultura física, intelectual e moral do povo.
A comissão reorganizadora reuniu-se há dias pela primeira vez e muito nos apraz registar a boa vontade que a todos anima e que, por certo, há-de produzir magníficos resultados. Ficou assente que os trabalhos da Escola se iniciassem desde já, com a distribuição seguinte de cargos:
Direcção: - Presidente, Dr. Aníbal Dias;
Vice-presidente, Augusto Lobo;
Secretario das actas, Dr. João Mamede;
Secretario de contabilidade, tenente Zeferino Barbosa;
Tesoureiro, Acácio Ferreira de Matos;
Director da Biblioteca (interino), Dr. João Mamede;
Secção de Estudos Gerais, Director, Dr. João Mamede;
Secção de Escotismo, Director, Joaquim Oliveira;
Secção de Agricultura, Director, Augusto Lobo;
Secção de música e teatro, Director, Dr. Anibal Dias;
Secção de Educação Física, Director, tenente Zeferino Barbosa;
Secção de Higiene, Director, Dr. Manuel Afonso;
Secção de tiro, Director, António José Gonçalves;
Secção de Educação social, Director (interino). Dr. Aníbal Dias;
Secção de Filantropia, Director, Duarte Portugal e
Secção de Propaganda, Director, Dr. Mário Gomes da Silva

Foi resolvido convidar o Dr. Bento Carqueja, ilustre director do «Comercio do Porto», a vir, em breve, realizar a esta vila uma conferencia.
Resolveu-se mais que a Escola-Livre de Mortágua se faça representar no passeio de estudo a Coimbra, que a Escola-Livre de Azeméis promove em 16 de Julho próximo, dia santo.
Este passeio projectado para o ano findo, não pode realizar-se por motivo do movimento revolucionário de 28 de Maio……..”

Logo a seguir, a Escola sentiu a necessidade de vir a público com um esclarecimento:
“Comunicado da Escola Livre de Mortágua
Para evitar que de futuro surjam erróneas interpretações, acha a Escola Livre de Mortágua conveniente, necessário mesmo, definir mais uma vez , e esta por todas, os fins que, consciente da sua missão, se propõe atingir…

A Escola Livre de Mortágua é profundamente neutra em matéria politica e religiosa, e, portanto, não atacará nem defenderá nenhum sistema politico, nenhuma atitude religiosa ou ateísta, mas antes, e acima de tudo, procurará, pela Doutrinação moral e intelectual, fazer surgir homens livres,  com o espirito esclarecido e alma sã, conscientes dos deveres que têm a cumprir para com os seus semelhantes.
Serão esses homens livres possuidores dum estado moral e intelectual que lhes permita, nas contingências da vida, seguir aqueles sistemas políticos, aquelas atitudes religiosas ou ateístas que lhes pareçam, por convicção e amor da humanidade, os mais próprios para uma vida melhor.
Assim o homem livre será republicano ou monárquico, crente ou ateu, conforme o que lhe ditarem a sua inteligência e o seu coração, aperfeiçoados pelos ensinamentos da Escola Livre, e não porque esta, por sugestões interessadas, para essas atitudes os encaminhe.
Esta neutralidade, que será mantida com todo o rigor, não implica, de forma alguma, a imposição aos escolares do abandono das suas atitudes politicas, religiosas ou ateístas, que eles continuarão, enquanto a sua convicção não mudar, a defender, como próprio é de gente de bem.
Ninguém poderá, portanto, responsabilizar a Escola Livre pelas apreciações que a qualquer facto seja feita pelos escolares, não  no exercício da actividade que lhes incumbe, mas como simples espectadores, e no uso legítimo do seu direito de cidadãos.
Quem quer que surpreenda na actividade da Escola Livre, pelas suas diferentes secções, a mínima sombra de parcialidade, prestará um serviço a si mesmo e aos ideais que procura defender, se a der a conhecer ao Ex.º Sr. Presidente, ou ao Director da respectiva secção, e, para tanto, apontará factos concretos que, facilmente verificáveis por toda a gente, terão mais valor que as acusações vagas, imprecisas.
Mortágua, 31 de Maio de 1927
O Director da Secção dos Estudos Gerais
João Pais de Carvalho Mamede “

Com maiores ou menores limitações A Escola Livre foi-se mantendo até 1937, ano em que acabou completamente a sua existência.

O jornal Os Sports, em  27 de Setembro de 1937  noticiou:
“MORTÁGUA
A situação da Escola Livre , Setembro, 21
– Nada se sabe ainda quanto ao futuro da Escola Livre de Mortágua, o clube mais popular da região e conhecido em todo o centro do País.
Encerrada a sua sede pelas autoridades – incidente que se verificou devido a informações tendenciosas, que pessoas de evidência no meio, procuram esclarecer – não pode calcular-se se o clube terá que ser dissolvido, ou se poderá seguir o caminho que brilhantemente percorre há 18 anos.
Com larguíssima folha de serviços à causa desportiva, organizador e de provas importantes no desporto nacional, como o Mortágua- Viseu – Mortágua em ciclismo, disputados anos seguidos, nos tempos heróicos do pedal, como as Taças “Portugal -América” e “Maria Cristina” em tiro, que trouxeram a Mortágua a fina flor dos atiradores portugueses; praticando football, atletismo, ciclismo, basquet, tiro, etc, contando campeões regionais em alguns desportos, e chegando mesmo a ter um seu associado campeão de Portugal em tiro, não é sem mágoa que os mortaguenses, decerto acompanhados pelos inúmeros clubes e desportistas com ele relacionados, verão desaparecer o velho clube preto e branco.”

O seu sector desportivo foi autorizado a continuar desde que mudasse de nome. Daí nasceu o Mortágua Futebol Clube.  Permaneceu vivo o futebol, mas as outras modalidades desportivas deixaram de existir.
Há dias tivemos acesso à fotografia do troféu Taça Portugal- América, que o tenente Zeferino Barbosa ofereceu ao Sr. Arnaldo Lourenço, um dos atiradores afamados da Escola Livre de Mortágua.

Inscrição no Troféu;
PORTUGAL-AMÉRICA
OFERECE
À CARREIRA DE TIRO CIVIL
MOCIDADE DE MORTÁGUA
U.S.A.

quarta-feira, 7 de junho de 2017


Um belo painel de azulejo e uma pintura mural
 

 
Santuário de Nª Sr.ª do Chão de Calvos


Numa casa já desabitada há alguns anos, observamos um painel de azulejo datado  de 1951. O painel retrata o santuário de N.ª Sr.ª do Chão de Calvos, é da autoria de J R. Santos, e foi executado na Fábrica de Sacavém.
Seria talvez interessante que a Câmara Municipal o adquirisse, antes que alguém o destrua.
 


Sobre o mesmo motivo, aproveitamos para mostrar uma pintura mural de Alfredo Cândido, executada em Mortágua, em 1947.


Azulejos Mouriscos na Igreja de Mortágua

 

Após a reocupação cristã da península ibérica, ficaram muitos muçulmanos, a quem foi permitido manter a sua religião, o seu idioma e os seus costumes.
Eram os mudéjares. Influenciaram muitas actividades, entre elas as artes decorativas.
Daí que na época em que foi construída, ou talvez reconstruída, a igreja matriz de Mortágua, fosse usual utilizar os azulejos hispano-árabes  para decoração de altares e edifícios religiosos.

Maria José Goulão no seu trabalho “Alguns problemas ligados ao emprego de azulejos «mudéjares» em Portugal nos séculos XV e XVI” diz-nos:

Ao longo das centúrias de Quatrocentos e Quinhentos, as remessas vindas de Espanha, umas de grande vulto e de valor artístico inestimável, outras mais modestas, transformaram radicalmente o aspeto de muitos dos nossos edifícios de caráter religioso e civil. A decoração cerâmica tornou-se de tal forma apreciada que se criou uma verdadeira moda, o que se compreende tendo em conta o grande efeito decorativo dos azulejos «mudéjares», o seu relativamente baixo custo e fácil aplicação.

 
Apesar de muitas remodelações feitas na igreja desde então, há um conjunto de azulejos que persiste até hoje, embora tenham, provavelmente mudado de localização e de função.
Entre as fichas de inventário constantes  da  Colecção Santos Simões na página da Fundação Calouste Gulbenkian, sobre a Igreja Paroquial de Mortágua, entre outras considerações eventualmente desactualizadas, encontramos o seguinte registo:
 «Na capela mor, na parte inferior da parede do lado do ev., restos do silhar que teria sido de azulejo mudéjar, aproveitamento, provavelmente, dos azulejos do primitivo frontal do altar

 
 
À entrada da igreja, situada à esquerda existe um compartimento com uma antiga pia batismal de pedra ladeado por três painéis com azulejos mouriscos. O painel central apresenta um Cristo Crucificado em pedra, rodeado de azulejos. Os painéis laterais são só de azulejos.
 
 
 
 
Para melhor apreciação, acrescentamos alguma imagens mais pormenorizadas.
 





 

 
 

sábado, 3 de junho de 2017


A Vespa velutina nigrithorax
ou
O Silêncio dos Inconscientes

Desde 2004, a Europa tem vindo a ser invadida por uma vespa asiática, que terá chegado a Bordéus numa encomenda de produtos hortícolas, proveniente da China.
Daí se difundiu, e foi identificada no Norte de Portugal em 2011. Desde então tem avançado para Sul, encontrando-se já implantada em quase todo o território nacional.
Esta vespa ataca as abelhas produtoras de mel, das quais se alimenta, destruindo os enxames. Os resultados são terríveis, pela perda da produção de mel, mas ainda piores pelo prejuízo causado à polinização das árvores e outras plantas dependentes da acção das abelhas para a sua frutificação.
Devia ser um dever cívico vigiar e relatar todas as ocorrências relacionadas com o aparecimento deste insecto, em particular o aparecimento dos seus ninhos, para que se possa combater com o máximo de eficiência. E deveria ser função das autoridades municipais esclarecer a população sobre o modo de identificar os ninhos, e comunicar a quem de direito para tomar as medidas necessárias.
Pois bem, têm-se remetido a um perigoso silêncio, ao que consta, para evitar o “alarmismo”. Acontece que o alarme devia ser dado a tempo, para não chegarmos à situação de não haver maneira de controlar a praga.  
Actualmente, a única maneira de controlar localmente este flagelo é através da destruição dos seus ninhos, feita de modo correcto.

Comecemos pela identificação do insecto:
A vespa rainha tem cerca de 3cm de comprimento; as vespas obreiras aproximadamente 2,5 cm.

A cabeça é preta e acastanhada. O corpo (toráx) é castanho-escuro ou negro e delimitado por uma fixa amarela. O abdómen  é um segmento único em tons acastanhados e alaranjados.
As extremidades das patas são amarelas.

 Ciclo de vida da vespa asiática

Nos meses de Janeiro e Fevereiro, as vespas rainhas hibernam na terra.
Em Março e Abril as vespas rainhas fazem os ninhos primários onde em Maio nascem as primeiras obreiras.
Em Junho e Julho, fazem os ninhos secundários onde se reproduzem de modo acelerado.
Em Setembro –Outubro dá-se a fecundação das futuras rainhas.
Em Novembro-Dezembro morrem os machos e as vespas obreiras, permanecendo vivas as rainhas, que de seguida hibernam.

 
 
Os ninhos primários


Construídos pela vespa rainha, de pequenas dimensões (5-10cm), são os locais onde nascem as primeiras vespas obreiras. Já foram descritos nas mais variadas estruturas, inclusive no solo. Segundo os homens empenhados no combate, é esta a fase mais favorável para lutar contra a difusão da praga. É de toda a conveniência que as pessoas os identifiquem e comuniquem a sua existência.

 
Os ninhos secundários
 
A partir dos ninhos primários a vespa rainha e as novas obreiras partem para a construção dos ninhos secundários, de grandes dimensões, arredondados ou em forma de pera, chegando a ter um metro de maior eixo, por 80cm de menor.

Normalmente são construídos em locais altos, de difícil acesso, acima dos 5 metros de altura, e neles nascem novas obreiras em ritmo acelerado.
Como se compreende é complicado o combate nesta fase.

Como se combatem? Quem os combate?
A única forma de combate, neste momento, passa pela destruição dos ninhos, primários ou secundários, com as vespas no seu interior.
 



Se por acaso ficam vespas fora do ninho, estas constroem novo ninho e continuam a sua actividade, como aconteceu no caso  que fotografamos acima. Isso implica que o ataque ao ninho tem de ser feito de noite, para que todas as vespas estejam recolhidas.



O acesso aos ninhos secundários, a maioria das vezes tem de ser feito escalando as arvores em que estão instalados e protegidos com equipamento adequado o que implica grande coragem e esforço físico.

Em Mortágua existe uma equipa que se tem dedicado a esta corajosa actividade e que se intitula Brigada anti-velutina. Vemos nesta fotografia  Mário Mendes, de Macieira, e Paulo Martins, de Falgaroso da Serra, pertencentes a esta brigada.

Não têm apoios oficiais. Não têm nenhum seguro que os proteja no caso de uma adversidade. Não recebem medalhas no Dia do Município.
Tanto quanto sabemos, a sua técnica habitual consiste em injectar com gasolina todo o ninho secundário, paralisando e matando as vespas, e colheita do ninho em bloco com o ramo em que está implantado.
No presente ano já destruíram mais de 10 ninhos primários, estando a começar a época dos ninhos secundários.
Durante a época passada foram destruídos 58 ninhos secundários. É de salientar que durante o Verão é difícil ver os ninhos devido à densidade da folhagem e à altura a que estão, e só quando as folhas começam a cair, no Outono, se conseguem avistar.
Apresentamos aqui duas fotografias que permitem apreciar a estrutura interna de um ninho secundário

 Finalizamos com o emblema da Brigada anti-velutina.
Há que apoiar estes homens no seu corajoso combate contra a vespa assassina das abelhas, que nos dão mel e polinizam as plantas.