quarta-feira, 3 de maio de 2017


Mortágua e os seus donatários

INTRODUÇÃO

Desde que comecei a ler algumas afirmações proferidas em discursos, ou escritas em livros sobre Mortágua, pelo Dr. Assis e Santos, venho afirmando que são uma fonte de falsificação histórica. Infelizmente, muitos tem sido os conterrâneos que tem acreditado, por ignorância ou conveniência, em tudo o que Dr. Assis disse, sem fazer qualquer análise crítica sobre o conteúdo das suas sentenças. Ocasionalmente têm chamado pessoas com responsabilidade técnico-científica para validar a reedição de obras suas, que mostrando alguma ignorância sobre os assuntos versados, não deixam de dar uma opinião favorável, embora se defendam de futuras críticas. É exemplo disso a Professora Dr.ª Maria Alegria Fernandes Marques que diz no prefácio da mais recente edição de O pelourinho de Mortágua (2016): «Embora não seja de esperar - muito menos exigir - um grau elevado de rigor histórico na obra de Assis e Santos, ela merece ser celebrada, tal qual o faz hoje, o Município de Mortágua. Assis e Santos é uma figura conhecida e lembrada na terra, cuja memória não é demais enaltecer; a sua obra é – passadas tantas décadas – ainda a base do conhecimento do seu passado.». Ora, a gravidade da questão é essa: passadas tantas décadas, o nenhum rigor histórico da obra do Dr. Assis continua a ser base do conhecimento do passado de Mortágua.
Nem todos os autores são tão compreensivos com o Dr. Assis. Em 1961, o erudito Joaquim da Silveira, num artigo publicado na Revista Portuguesa de Filologia  intitulado  Uma explicação sobre “Mortágua”, falando sobre o livro Mortálacum diz: «Nessa monografia, que me parece geológica e topograficamente valiosa (Sem poder dizer o mesmo no ponto de vista histórico e menos ainda quanto a etimologias…)». Ou seja, naquilo que o Dr. Silveira não é perito, a obra parece-lhe valiosa. Já não pode dizer o mesmo daquilo que lhe é mais familiar. Estamos entendidos…
Pois bem, partindo dessa base do conhecimento, não tem faltado os repetidores dos escritos do Dr. Assis, alguns citando a fonte, outros copiando de modo mais ou menos claro, sem citar fontes. Aliás nada ficam a dever ao Dr. Assis que só usava as citações que lhe interessavam, adulterando-as quando lhe convinha.
As faltas de rigor histórico do Dr. Assis, para não usar linguagem mais agreste, são inúmeras. Podemos citar algumas que já tiveram consequências, e que dificilmente serão reparáveis. Uma delas é a questão do primeiro donatário (Senhor) de Mortágua que o Dr. Assis diz ter sido “D. Vasco Martins” no período de “1192-1209”, sobre o qual afirma:

Na Corte de D. Sancho I vivia um personagem com o nome de D. Vasco Martins.
D. António Caetano de Sousa, desconhecendo essa informação só existente no nosso foral manuelino, diz num quadro genealógico da História da Casa Real que o 2ª donatário de Mortágua foi Martim Afonso de Sousa, considerando como primeira a doação da nossa vila, por ele conhecida, que D. Afonso IV fez à Infanta D. Maria sua neta. Como esse autor enumera todos os donatários que tiveram a nossa vila desde 1354, conclui-se que a doação de Vasco Martins, foi anterior a 1354 e que Martim Afonso de Sousa já foi verdadeiramente o 3º donatário de Mortágua.
O primeiro donatário da nossa vila foi portanto D. Vasco Martins de Vila Nova, mordomo-mor de D. Sancho I em 1208. No foral de 1182 não figura o nome de D. Vasco Martins. Mas são especificadas as condições da doação, quer para o reguengo, quer para os moradores da vila.”

A consequência dificilmente reparável é que em Vila Nova já existe uma praça com o nome de Vasco Martins, que os habitantes da aldeia pensam ser seu conterrâneo. Passemos então a analisar o texto.
Existiu na Corte de D. Sancho I um personagem com o nome de D. Vasco Martins?
Existiu de facto um Vasco Martins (Valascus Martini) na Corte de D. Sancho I. Aparece em alguns documentos da época que constam do livro Chancelaria  de D. Afonso III 1,  nomeadamente:
- No Foral de Rebordãos (Bragança), de 1208,  que confirma, na qualidade de maiordomus curie.
 - Na Carta de aforamento aos povoadores de Andrães ( Vila Real) de 1208, onde  Valascus Martini actorizat et confirmat, e
 - Na Doação do reguengo de Ifanes e Constantim ao abade do mosteiro de Moreruela, de 1211, onde Valascus Martini  confirma na qualidade de dapifer domini regis, sendo Gonçalvus Menendiz maiordomus curie.

1 VENTURA, Leontina; OLIVEIRA, António Resende de: Chancelaria de D. Afonso III, Livros II e III. Imprensa da Universidade de Coimbra. Coimbra 2011
Frei Joaquim Viterbo2, esclarece-nos que maiordomus curiae corresponde ao Mordomo Menor da Casa Real, também designado Subdapifer, que era sempre um cargo de “exercício e serventia”, enquanto que o Mordomo Mór da Casa Real, ou  dapifer era muitas vezes só de “Título ou Honorário”.
O mordomo-mor era o principal oficial da Casa Real que superintendia sobre todos os outros funcionários. No início do Reino, em que os assuntos da Casa Real se confundiam com os negócios do país, o mordomo-mor chegou a assumir funções equivalentes a um actual primeiro-ministro.

2 VITERBO, Fr. Joaquim de Santa Rosa de : Elucidário das Palavras, Termos, e Frases, que em Portugal Antiguamente se Usárão , e que hoje regularmente se ignorão, Tomo Segundo, G—Z; Typographia Regia Silviana,  Lisboa 1799.
Não restam dúvidas que entre 1208 e 1211 um Vasco Martins (Valascus Martini) desempenhou funções importantes na Corte de D. Sancho I, mas não há documento nenhum que o ligue a Mortágua. Não se conhece qualquer carta de doação. Mesmo que existisse uma carta de doação, não seria a um natural de Vila Nova, uma vez que o cargo de Mordomo-mor era atribuído  a pessoas consideradas nobres, e de grande confiança do rei, que certamente não existiriam num município recém-criado, sem tradição de casas senhoriais.
Mesmo o período que o Dr. Assis refere - 1192-1209 - como dizendo  respeito ao intervalo entre a concessão do Foral e o falecimento de Vasco Martins, não tem razão de ser uma vez que em 1211, este ainda desempenhava funções de Mordomo-mor.
E continua Assis e Santos:
D. António Caetano de Sousa, desconhecendo essa informação só existente no nosso foral manuelino, diz num quadro genealógico da História da Casa Real que o 2ª donatário de Mortágua foi Martim Afonso de Sousa, considerando como primeira a doação da nossa vila, por ele conhecida, que D. Afonso IV fez à Infanta D. Maria sua neta.

Neste parágrafo dizem-se coisas assombrosas e falsas.
D. António Caetano de Sousa 3 considera Vasco Martins de Sousa o 1º Senhor de Mortágua, e o seu irmão Martim Afonso de Sousa, o 2º Senhor. Este Vasco Martins de Sousa era bisneto de D. Afonso III e filho da Abadessa do Convento de Arouca e só passou a ser efectivamente Senhor de Mortágua, em 13854, por doação de D. João I.

3 SOUSA, D.António Caetano: Historia Genealógica da Casa Real Portugueza, Tomo XII, Parte II,Regia oficina Sylviana,Academia Real, Lisboa M DCC XL VIII
4 IAN/TT, Chancelaria de D. João I, Liv. 1, fl. 120

 É a este Vasco Martins de Sousa que se refere o foral manuelino quando  diz  o foral dado per vasco mtz de ujlla noua Senhor”, e Vasco Martins é de villa nova senhor,  e não vasco martins de villa nova, senhor.
Pensamos poder transcrever assim esta passagem do Foral:

« Acerca dos Forais dos nossos Reinos, e ditos Reais, e tributos que sempre eles deviam arrecadar e pagar, e  também pelas Inquirições que principalmente mandamos fazer em todos os lugares de nossos Reinos e Senhorios, justificadas primeiro com as pessoas com os ditos Reais tinham, vimos o foral dado por vasco mtz , Senhor de Vila Nova por carta do Rei dos ditos da dita terra àquele tempo, para que os tributos, foros e ditos Reais se devem e hão-de arrecadar e pagar na dita terra daqui em diante na  maneira e forma seguinte. »

Quando Assis e Santos fala de uma Infanta D. Maria, deverá estar a referir-se a D. Maria Afonso, filha de D. Dinis, e por isso neta de D. Afonso III , e não Afonso IV.
Por razões que escapam à minha compreensão, só  a partir de Vasco Martins de Sousa, também chamado de “Chichorro”, são contabilizados os donatários de Mortágua, embora haja documentação que atesta a doação de Mortágua várias vezes antes da sua atribuição a Vasco Martins.
Na nossa opinião, deveria ser considerado o 8º Donatário de Mortágua.

Os Donatários de Mortágua
D. António Caetano de Sousa na sua obra monumental “História Genealógica da Casa Real Portugueza, desde a sua origem até ao presente…”, publicada no século XVIII, considera Vasco Martins de Sousa (também apelidado de Chichorro), o primeiro Senhor de Mortágua, embora ao longo da sua obra se perceba que, antes dele, outras pessoas detiveram o poder sobre a vila de Mortágua. Por outro lado, fomos encontrar em outros autores referências a vários personagens que desempenharam esse papel, aparentemente suportadas por documentação existente em arquivos de alguma credibilidade. Dessa busca, que incide quase exclusivamente sobre livros publicados, iremos dar conta neste trabalho, que naturalmente é limitado pela falta de formação histórica do seu autor, e pela dificuldade de um estranho ao meio académico aceder a algumas fontes de informação.

***
O primeiro Foral de Mortágua
Em 1192, foi concedida pela Rainha D. Dulce, em representação do Rei D. Sancho I, o Povoador, a primeira carta de foral a Mortágua. Esse documento faz parte do Fundo da Colegiada de S. Cristóvão de Coimbra do Arquivo Público, e encontra-se transcrito no livro Portugaliᴂ Monumenta Historica – Leges et Consuetudines , Volumen I, Fasciculus III .Academiae Scientiarum Olisiponensis. Olisipone MDCCCLXVIII. Pg. 482.

Rui Pais Valadares ou Rodrigo Pereira
Supomos que o 1º donatário de Mortágua terá sido Rui Pais de Valadares, pai do famoso Frei S. Gil, dito de Vouzela,  ou de Santarém. Em alguns escritos é chamado Rodrigo Pereira.  É referido por vários autores como Alcaide de Coimbra, no reinado de D. Sancho I (1185-1211), e também como mordomo-mor do mesmo rei (inclusive na página actual da Casa Real na Internet). No entanto, é no reinado de D. Afonso Henriques que o nome de Rodericus Pelagii ou Pelaiz aparece nos documentos como alcaide de Coimbra. Em 1147, uma carta de venda de uma herdade de Podentes é feita a favor do «alkaide de Colimbria Roderico Pelaiz et uxori uestre Eluire Rabaldiz». O Livro de D. João Teotónio contem o testamento feito em 1159, em favor do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra: «Testamentum alkaidi Domni Roderici et uxoris eius Eluire Rabaldiz».

A afirmação de que  Rodrigo Pais teria sido Mordomo-mor de D. Sancho I também não parece ter sustentação nos documentos dessa época, onde nunca aparece designado como tal.
O  2º Visconde de Santarém, Manuel de Barros Leitão e Carvalhosa, nas suas MEMORIAS CHRONOLOGICAS AUTHENTICAS DOS ALCAIDES MORES DA VILLA DE SANTARÉM , Lisboa 1825, informa-nos que:

“O terceiro Alcaide Mór de Santarem , de que pudêmos colher noticia, foi Rui Paes de Valadares, donde descendem os antiquíssimos Senhores da Caza da Cavallaria e exerceo este cargo pelos annos de 1190, reinando o Senhor Rei D. Sancho I.”, referindo como fonte: Mem. Histor. e Geneal. da Famil.d’ Almeidas, Senhores de Moçamedes , por Fr. José d’Almeida, e Manoel de Sousa da Silva , no Cartor. dos Condes da Lapa.
Identificado o candidato, vejamos o que se sabe sobre a sua ligação a Mortágua.

António Pereira Forjaz, da Academia de Ciência de Lisboa, onde afirma existirem manuscritos sobre Frei Gil, não tem dúvidas em afirmar:
"D. Gil ou Egídio de Valadares viu a luz em Vouzela - em 1185: dez anos antes de Santo António - no solar de seu pai, D. Rui Pais de Valadares, senhor de Mortágua e Gonfalim, Pretor ou Alcaide-mor do Castelo de Coimbra".

FORJAZ, A. Pereira, São Frei Gil e a Academia das Ciências de Lisboa. Boletim da Academia das Ciências de Lisboa, XXXVII, 1965: 277-293.
Também Eça de Queiroz, num manuscrito intitulado Frei S. Gil, destinado a um livro sobre a vida de santos, inacabado à data da sua morte (16 de Agosto de 1900), escreveu:
O solar de D. Rui de Valadares, Senhor de Mortágua e Gonfalim, era a duas léguas duras de Vouzela, numa colina, por onde descia, espalhada até ao rio, entre olivais e vinhedos, a aldeia de Gonfalim. Um fosso, uma muralha delgada e simples como um muro de herdade, uma torre construída em tempos da Senhora Rainha D. Tareja, defendiam a casa térrea, a capela, os celeiros, o forno, o pátio bem lajeado, onde dois chorões davam frescura e sombra a uma fonte de bronze. Para além um alto silvado, coberto de amoras pelo S. João, envolvia a abegoaria, a eira clara, o redil, um pomar bem regado, e o campo de tavolagem: – e depois, por todo o outro pendor do outeiro, lento e suave, verdejavam os pastios de gado.”

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Existe um período abrangendo os reinados de D. Afonso II e D. Sancho II em que não encontramos notícia de donatários de Mortágua, pelo que pensamos ter estado sob controlo directo da Coroa. Em contrapartida D. Afonso III fez várias doações de Mortágua.
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João Pires (ou Peres) Farinha
Leontina Ventura e António Resende de  Oliveira, no livro Chancelaria de D. Afonso III. Livros I e II, transcrevem  uma “sentença sobre as direituras de Mortágua”, datada de 1266, que demandava “Johannes petri dictus Farina”, e lhe tinham sido concedidas por D. Afonso III.
João Pires Farinha, que nesta altura ainda era um frade desconhecido, embora irmão de duas figuras importantes da ordem de Malta, D. Afonso Pires Farinha e D. Vasco Pires Farinha.  Viria a ser, anos mais tarde, Comendador da Ordem de Malta, como o comprovam as decisões que veio a tomar, segundo o que é relatado por Jozé Anastasio de Figueiredo no livro Nova História da Militar Ordem de Malta, Parte II.
Pensamos que terá sido o 2º donatário de Mortágua.

Teresa Fernandes de Seabra
Em 1268, dois anos depois da sentença acima referida, D. Afonso III fez a doação de Mortágua a uma das suas amantes, Teresa Fernandes de Seabra, então com 18 anos, que seria a terceira Donatária de Mortágua. A carta de doação consta da Chancelaria de D. Afonso III, Livro I, Vol.1., publicada por Ventura e Oliveira, anteriormente referidos.
Em 1270, Teresa F. Seabra casou com Martim Martins Dade, que pertencia ao Conselho Régio e viria a ser alcaide-mor de Santarém, pelo que deverá ter  perdido os seus direitos sobre Mortágua.

Leonor Afonso
Em 1271, D. Afonso III faz um testamento em que doa Mortágua à sua filha ilegítima, Leonor Afonso, que seria a quarta senhora de Mortágua.
D. Leonor Afonso casou em segundas núpcias com Gonçalo Garcia de Sousa ,tio do primeiro marido (Estevão Anes), que por essa altura detinha a chefia da linhagem dos Sousa, e que atingiu uma posição de grande prestígio na hierarquia da nobreza nacional, e extenso património.
Esta doação a D. Leonor foi confirmada pelo rei D. Dinis, seu irmão.
Depois de enviuvar, Leonor Afonso professou no Convento de Santa Clara de Santarém1 e pediu a D. Dinis que lhe permitisse deixar em Testamento 2  a herdade de Mortágua ao dito Convento, o que foi autorizado e se concretizou em 1293.3

1BRANDÃO, Fr. António: DA MONARCHIA LVSITANA, QVINTA PARTE. Mosteiro de S. Bernardo. Lisboa 1650

2 Carta do rei D. Dinis em que diz que D. Leonor lhe pediu para poder deixar ao mosteiro os seus bens de Mortágua (dados por D. Afonso III a Leonor Afonso e confirmada a doação por D. Dinis, reservando o rei para si a colheita, em 1277 in TT, OFM, PP, SCS, liv. 24, fl. 23 e Chancelaria de D. Dinis, liv. 2, fl. 29) e Azambuja. O rei consente, apesar das leis de desamortização – 1292 (PF 1421) - (TT, OFM, PP,SCS, Mç. 8, doc. 405 e 406).

In ANDRADE, Maria Filomena Pimentel de Carvalho: IN OBOEDIENTIA, SINE PROPRIO, ET IN CASTITATE, SUB CLAUSURA . A ORDEM DE SANTA CLARA EM PORTUGAL (SÉCS XIII – XIV), tese de doutoramento. Universidade Nova de Lisboa , 2011

3SOUSA , D. ANTÓNIO CAETANO DE: PROVAS DA HISTORIA GENEALÓGICA da CASA REAL PORTUGUEZA, TOMO VI; Regia Officina SYLVIANA, e da Academia Real. Lisboa, M DCC. XL VIII. , pag 574 e 575

 
Mosteiro de Santa Clara de Santarém
Mortágua permaneceu na posse do Mosteiro de Santa Clara, seu quinto donatário até1319, data em que foi permutada em favor de D. Maria Afonso, filha bastarda de D. Dinis, recebendo o cenóbio 100 estis1 de herdade no reguengo de Toxe, no termo de Santarém, e 4610 libras.2

Em поте da dita D. Maria Afonso fizerão escaimbo em esta maneira. Conuem a saber que a dita Abbadessa, & Conuento dauão em escaimbo à dita D. Maria Afonso terra de Mortagoa, que foi de Dona Lianor , irmãa do dito senhor Rey , & Donna dessa Ordem com todo o senhorio, & jurdição. 3

 Frei António Brandão 4 acrescenta alguns pormenores:
 
Do casamento de D. Maria filha d’elRey Dom Dinis com D. João de la Cerda.
Como fica escrito no anno passado de 1317, em que ElRey foi a Galiza, deuia praticar o casamento de sua filha D. Maria, avida em D. Marinha Gomes natural de Lisboa como se pode ver na 5. Parte com D. João de la Cerda pretensor dos Reynos de Leão, & Castella, pelas rasoens que temos dado varias vezes. O que então se praticou, teue efeito no anno presente na Villa de Santarem, aonde se celebraram os desposórios com a grandesa que a taes pessoas se deuia. A 3 de Abril naquela Villa se fes troca com a Abbadessa, & Convento de S. Clara em nome de Dona Maria Afonso esposa que na escritura se nomea deste D. João, pela qual alcançaram das Religiosas o lugar de Mortagoa com toda a jurisdição, & senhorio.
Veo este lugar àquelle convento por via de D. Leonor Afonso mea irmãa d’elRey D. Dinis Freira professora que foi naquela casa, que tudo se declara na escritura. Alem disto lhe deu ElRey grande dote em terras, & fazenda com que os esposados sustentarão casa igoal a seu estado

 

1Astil ou Astim. Certa medida agraria, a que hoje chamam estim , ou estil, e se pratica no campo de Santarem, e suas contiguidades: tem vinte e cinco palmos craveiros de largo, e de comprido toda a extensão do campo, vinha, prédio, monte ou paúl. No campo de Coimbra usam de aguilhadas em lugar de estins... (VITERBO, Joaquim de Santa Rosa de : Elucidario das Palavras, Termos e Frases que em Portugal Antigamente se Usaram. Tomo Primeiro. Lisboa 1798)

2 (Cf. ADS, Convento de Santa Clara de Santarém, Gav. 1, 9 e TT, Chancelaria de D. Dinis, liv. 3, fl. 124v)

3 (Torre do Tombo, livro 3º delRey D. Diniz . fol.24)

 4 BRANDÃO, Fr. António: MONARCHIA LVSITANA, SEXTA PARTE. Mosteiro de S. Bernardo. Lisboa 1672

 

Maria Afonso
Em 1319, Maria Afonso, filha ilegítima de D. Dinis, passa a ser a 6ª Senhora de Mortágua. Foi também senhora de Gibraleon em Huelva, na Andaluzia1
por casamento  com João Afonso de La Cerda, que em 1337 passou a estar ao serviço do Rei Afonso de Castela 2 contra os mouros, em Gibraltar, mas depois veio a combater o Rei português D. Afonso IV, ao serviço de Castela.
Embora tivessem descendência, tudo indica que tenham  perdido os seus direitos sobre Mortágua.


1BARBAS,  Helena: D. Dinis e as Donas – Uma galeria.( In Dinis , O rei civilizador ); Ésquilo, edições e multimédia. Lisboa 2009

2 BRANDÃO, Fr. António: MONARCHIA LVSITANA, SEXTA PARTE. Mosteiro de S. Bernardo. Lisboa 1672

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Não temos informação sobre a posse de Mortágua nos reinados de D. Afonso IV e D. Pedro.

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Infanta D. Beatriz ou Brites
Em 24 de Março de 1373, D. Fernando I,  doou a Vila de Mortágua a sua filha Infanta D. Beatriz, nascida um ano antes.  Terá sido a 7ª Senhora de Mortágua, embora possivelmente nunca a tenha visto.
Dessa doação temos notícia através de António Caetano de Sousa1 , que descreve o selo que autentica o documento:
XXXVI. Este Sello he de chumbo , pendente de fios de seda encarnada , e verde , com esta letra :
Sigillum Domini Fernamdi Portugalitᴂ & Algarbii Regis, e se conserva tão perfeito , como fica aberto.
Está em huma doação feita à Infante D. Brites das Villas , e Lugares de Villa Monte , e das Alcaçovas , Ferreira , Terena , Lousãa , Arganil, Pedrogão , Penacova , Santa Comba , Mortagua, e outras nomeadas , para ella , e todos seus successores, e de todos os direitos Reaes, rendas, e tributos , e Padroados das Igrejas dellas , &c. Feita em Lisboa a 24 de Março da Era de 1411, que he Anno de 1373. Está na Casa da Coroa, gaveta 3. maço 2.”

 A infanta D. Beatriz viria a casar aos 10 anos de idade com o Rei D. João I de Castela.
Entretanto, em 1377, D. Fernando fez uma doação “em préstamo” de Mortágua, continuando a mesma a pertencer a D. Beatriz.

 1SOUSA, D. Antonio Caetano de : HISTORIA GENEALOGICA DA CASA REAL PORTUGUEZA, DESDE A SUA ORIGEM ATÉ O PRESENTE, Tomo IV, pp 29 e 30 ;Officina de JOSEPH ANTONIO DA SYLVA, LISBOA OCCIDENT AL, M. DCC. XXXVIII.

 
Vasco Martins de Sousa (Chichorro)
Depois da doação de Mortágua “em préstamo”, por D. Fernando, em 1377, D. João I viria a fazer a doação por juro de herdade10 , em 1385 a Vasco Martins de Sousa, que se tornou o 8º Senhor de Mortágua.

Era bisneto de D. Afonso III. O seu avô era filho bastardo desse rei e de uma moura, e casou com uma descendente da família dos Sousas,  que Felgueiras Gayo diz ser a família nobre mais antiga de Portugal. 1 O pai de Vasco Martins, Martim Afonso Chichorro, gerou-o em Dª Aldonça Anes de Briteiros, que era a Abadessa do Convento de Arouca.
Vasco Martins de Sousa cresceu na corte de D. Afonso IV, foi criado do Infante D. Pedro, que o tornou seu Chanceler-mor quando subiu ao trono, em Maio de 1357.   Ainda infante, em 6.12.1341, D. Pedro foi fiador do contrato de casamento de Vasco Martins  com Inês Dias Manuel. O próprio rei D. Afonso IV presidiu ao casamento2. Por sua vez Vasco Martins foi testemunha do casamento secreto de D. Pedro com Inês de Castro.
O mesmo D. Pedro veio a conceder ao “primo”, em carta datada de 10.10.1357, os bens anteriormente pertencentes a Pêro Coelho, um dos assassinos de D. Inês de Castro.3

Continuou nas boas graças do rei D. Fernando, que no  ano em que subiu ao trono (1367) confirmou as doações.4
Ainda no reinado de D. Fernando, por carta enviada de Moledo em 13 de Setembro de1375, foram confiscadas as terras atribuídas a Vasco Martins, acusando-o de malfeitorias cometidas nas mesmas5, passando a beneficiar delas, João Afonso Pimentel.
Mas ,em 1 de Abril de 1377, D. Fernando fez a “doação em préstamo, enquanto sua mercê fosse, das rendas da terra de Mortágua6,  continuando a mesma a pertencer a D. Beatriz (filha do rei D. Fernando)7.

Foi apoiante das pretensões do mestre de Avis. Esteve presente nas Cortes de Coimbra em 1385.
Foi Escrivão da Puridade de D. João I. 8  9

1GAYO, Felgueiras: Nobiliário das Famílias de Portugal, Título de Souzas ;Braga 1941
2 TT- Chancelaria de D. Afonso IV, Lº 4, fl. 84v
3 TT- Chancelaria de D. Pedro I, Lº 1, fl.15v
4 TT- Chancelaria de D. Fernando, Lº 1, fl.13v
5ANTT, Chanc. DF, L. l, ff, 176 v.-In. A referência do local de expedição da carta é confirmada em M. C. T., RODRIGUES, "Itinerário de D. Fernando", Separata de Bracara Augusta, Braga, Câmara Municipal de Braga, 1978, p. 43.
6 IAN/TT, Chancelaria de D. Fernando, Liv. 2, fl. 3.
7FERNANDES, Comentários... , cap. 3, pp. 43-64; IDEM, "A fidelidade e o deserviço em Portugal no reinado de D. Fernando (1367-1383)", Revista da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica, 17 (2000), 53-63.
 
8( SOUSA, D. Antonio Caetano de :HISTORIA GENEALÓGICA DA CASA REAL PORTUGUEZA, TOMO XII. PARTE II., Regia Oficina SYLVIANA. Lisboa M.DCC.XL.VIII)

9 Escrivão da Puridade era antigamente o Officio de apurar Papeis da Casa Real , e correspondia ao que em tempo dos Romanos chamavão Conde dos Notários.
Punha as vistas nos Alvarás , e tinha em seu poder o molde , ou chancela da Firma do Soberano : instrumento introduzido por ElRei D. João II , para não pararem os despachos no tempo da sua doença. (VITERBO,Fr. Joaquim de Santa Rosa: Elucidario das palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usarão ….Tomo segundo ; Typographia Regia Silviana, Lisboa 1799 )

10 IAN/TT, Chancelaria de D. João I, Liv. 1, fl. 120.  Chancelarias Portuguesas, D. João I, Vol I, tomo 2, doc. 840.

 
Martim Afonso de Sousa
Irmão de Vasco Martins de Sousa, sucedeu-lhe como 9º Senhor de Mortágua. Esteve na batalha de Aljubarrota, e em 1415 participou na tomada de Ceuta.

Gonçalo Anes de Sousa
Sucedeu ao seu pai como 10º senhor de Mortágua. Teve de ser legitimado em 14001 pelo rei D. João I, porque Martim Afonso tinha casado com Maria de Briteiros, sua prima, sem as necessárias dispensas papais. 2
E por volta de 1402, quando D. João I decreta as redução das despesas da casa real, incluindo a rainha e os infantes, Gonçalo Anes de Sousa  é um dos “vinte grandes” que mantem como “moradores”3.
Em 21 de Agosto de 1403, concedeu um segundo foral a Mortágua. 4

1 TT- LºII, Legitimações, fl. 174v

2 SOUSA, D.Antonio Caetano de :HISTORIA GENEALÓGICA DA CASA REAL PORTUGUEZA, TOMO XII. PARTE II., Regia Oficina SYLVIANA. Lisboa M.DCC.XL.VIII

3Monumenta Henricina, Volume I, Coimbra 1960 . doc. 122, pg 280-293

4 FRANKLIN, Francisco N.: Memória para servir de índice dos Foraes das terras do Reino de Portugal e seus domínios,  2ª edição; Typografia da Academia Real das Sciências, Lisboa 1825 : «Veja-se o seu Foral antigo dado por Gonçalo Annes de Souza em Mortagoa a 21 de Agosto de 1403 no Maço 7. de Foraes antigos N.4

 

Mécia de Sousa e Sancho de Noronha
De Gonçalo Anes de Sousa e de D. Filipa de Ataíde, nasceria D. Mécia de Sousa, que viria a ser a 11ª Senhora de Mortágua. A confirmação da doação foi feita por D. Duarte em 26.01.1434 1.
D. Mécia desposou D. Sancho de Noronha, que, por carta de D. Afonso V de 9.10.1446, passaria a ser o 1º Conde de Odemira. 2   Daí resulta que, a partir de 1446, Mortágua passa a estar na dependência dos Condes de Odemira.
D. Sancho de Noronha foi Governador de Ceuta de 1451 a 1460.

1TT- Chancelaria de D. Duarte, Lº 1, fl.58. (ver anexo 1)

2 SANTOS, José Maria Simões dos : D. Frei Gonçalo de Sousa, Comendador-mor da Ordem de Cristo. Revista do Centro de Estudos de Genealogia e Heráldica Barão de Arêde Coelho. Cadernos Barão de Arêde, nº 3, Janeiro-Março 2015. www.arede.eu

 

Maria de Noronha e Afonso de Faro
D. Afonso, a quem D. Afonso V deu o título de Conde de Faro em 1469, casou em 1465 com Maria de Noronha, filha de D. Mécia e D. Sancho de Noronha(Conde de Odemira), com um contrato matrimonial que previa a doação imediata de todos os bens dos condes de Odemira, reservando o usufruto enquanto vivos. Em 1475, passou a ser o 2º conde de Odemira.
Relativamente a Mortágua, foram os 12os Senhores.

A subida ao poder de D. João II, em 1481, com uma orientação política mais absolutista do que D. Afonso V, despertou resistências e conjuras que culminaram, em 1483, na prisão e execução do Duque de Bragança, irmão de D. Afonso de Faro, e de muitos outros nobres.
Em 1484 os condes de Faro fogem para Espanha, onde D. Afonso morre nesse mesmo ano em Sevilha. Os bens terão sido confiscados, uma vez que o Conde de Faro acabou por ser postumamente condenado em 1485.1

D. Manuel I viria a conceder o título de Conde de Odemira e os correspondentes bens a D. Sancho de Noronha, filho de D. Afonso.

1 TORRES, João Carlos Feo Cardoso de Castello Branco e; BAENA, Visconde de Sanches de: Memórias Historico-Genealogicas dos Duques Portugueses do Seculo XIX; Academia Real das Sciencias. Lisboa 1883

 
Princesa Santa Joana

Filha de D. Afonso V e da Rainha D. Isabel. Nasceu  a 6 de Fevereiro de 1452.
Cedo manifestou o seu desejo de enveredar pela vida religiosa, no que foi contrariada pelo Pai e pelo irmão, D. João II. Não chegou a professar porque uma junta de teólogos se manifestou contra isso. Rejeitou várias propostas de casamento e manteve-se no convento como secular, fazendo no entanto voto solene de  castidade e continuando  a praticar todos os rigores da vida religiosa.
A 19 de Agosto de 1485 — El-Rei D. João II, por carta passada em Alcobaça, fez mercê a sua irmã, a Princesa Santa Joana, da vila de Aveiro, «com seus termos e com todas as rendas e direitos reais da dita vila e da dízima nova e velha do pescado dela»; o monarca, no mesmo documento, doou à irmã a vila de Mortágua e os lugares de Eixo, Requeixo, Paus e Óis e a quinta de Vilarinho e de Belazaima, com todos os seus reguengos, foros, rendas e tributos (Torre do Tombo, Místicos, livro 2, 120v).
Faleceu  a 12 de Maio de 1490, vítima de peste.
É reconhecida pela Igreja como Beata, mas não como Santa.
Foi a 13ª Senhora de Mortágua

 
Henrique Esteves da Veiga (& Nápoles)
Em data não especificada, mas no reinado de D. João II,  o Pe. António Carvalho da Costa 1 descreve como Senhor de Mortágua (14º na nossa contagem), Henrique Esteves da Veiga e Nápoles, que aparece fora da sequência normal da sucessão dos Condes de Odemira.
Certamente que isso se deve ao facto de D. Afonso de Faro, o 2º Conde de Odemira e Conde de Faro, ter fugido para Espanha, por temer pela sua vida.
D. João II tinha por politica confiscar os bens dos que considerava conspiradores, e naturalmente, promover os que entendia que lhe eram leais. Terá sido esse o mecanismo pelo qual o senhorio de Mortágua foi entregue a Henrique Esteves da Veiga, Senhor de Nandufe.
Alguns autores contestam o apelido de Nápoles que parece ter sido forjado mais tarde por Diogo Esteves da Veiga, bisneto deste Henrique, que passou a usar a designação de Nápoles, e criou documentos apócrifos para justificar uma descendência de Estefano de Nápoles, e a ligação à família real francesa.
Dos descendentes de Henrique Esteves da Veiga, não existe ligação conhecida a Mortágua, o que é natural, porque D. Manuel I, restabeleceu em D. Sancho de Noronha, filho de D. Afonso de Faro, os bens e honrarias anteriormente concedidas aos Condes de Odemira., Mas Henrique Esteves da Veiga deixou em Mortágua uma marca que ainda hoje perdura, embora ninguém a reconheça essa ligação.
Estou a referir-me ao Brasão de Armas que se encontra na fachada da Capela de Nossa Senhora da Piedade, em Vale de Açores.
Já lemos ou ouvimos dizer as mais variadas coisas sobre o brasão. Ora é dos Cadavais, ora é dos Odemira, ora é dos Frias…. Pois bem, os brasões correspondentes a essas famílias não tem qualquer parecença com o belo exemplar que ali persiste.  Atrevemo-nos a sugerir que é um brasão da família Esteves da Veiga, embora conscientes da limitação dos nossos conhecimentos nessa matéria, e de alguns pormenores que ainda nos intrigam.

 1COSTA , PADRE ANTONIO CARVALHO DA : COROGRAFIA PORTUGUEZA, E DESCRIPÇAM TOPOGRAFICA  DO FAMOSO REYNO DE PORTUGAL, tomo terceyro; Officina Real Deslandesiana, Lisboa M DCC XII ( Pg 57)

 
Sancho de Noronha  -  3º conde de Odemira
Acompanhou seu pai quando este fugiu para Castela, no reinado de D. João II.  
Em 1496, o rei D. Manuel  deu-lhe o titulo de conde de Odemira, com a grandeza e prerrogativa de parente com o tratamento de Sobrinho, e com todas as honras e privilégios concedidos aos seus antepassados, antes da sua fuga para Castela, e do confisco dos seus bens, nomeadamente o senhorio de Mortágua. 
Foi 15º Senhor de Mortágua.

 Sancho de Noronha – 4º conde de Odemira
Neto do anterior Sancho de Noronha (3º conde de Odemira)
Foi 4º Conde De Odemira, Senhor de Odemira, Mortágua, Penacova, e das terras de Riba de Vouga, e dos Julgados de Eixo, Oies, Paos e Vilarinho, Alcaide-mor de Estremoz e de Alvor.
D. João III confirmou os seus direitos em 1556.
Foi Mordomo–mor da Rainha D. Catarina, de quem foi testamenteiro.
D. Sebastião em carta de mercê de 8 de Junho de 1571, diz: Dom Sancho de Noronha, Conde de Odemira, meu muito amado sobrinho.
Foi 16º Senhor de Mortágua

 Afonso de Noronha – 5º conde de Odemira
Filho de D. Sancho de Noronha (4º Conde de Odemira)
Em 1578 foi com D. Sebastião, e morreu a 4 de Agosto na Batalha de Álcacer-Quibir
Foi o 17º Senhor de Mortágua

 Sancho de Noronha – 6º conde de Odemira
Foi o 18º Senhor de Mortágua
Nasceu oito meses após a morte de seu pai. Viveu durante o reinado de 5 reis.
El-rei D. Henrique, deu-lhe o tratamento de sobrinho  e confirmou-lhe a sua Casa por Carta de 27 de janeiro de 1580.
Os Reis Filipes mantiveram-lhe os privilégios.
Em 1640, quando D. João IV subiu ao poder, foi nomeado Mordomo –mor da rainha D. Luísa.
Faleceu em Dezembro de 1641

 D. Francisco de Faro e Noronha - 7º conde de Odemira
O 6º conde de Odemira não deixou sucessão. D. João IV, concedeu a D. Francisco, parente dos Condes de Odemira, a posse de toda a Casa e honras inerentes a essa família. A concessão destas mercês deve-se a ter sido um dos primeiros apoiantes de D. João IV.
Este nomeou-o para o Conselho de Estado, onde terá desempenhado um papel importante.
Após a morte do Rei, a Rainha-Regente nomeou-o aio e preceptor do jovem Rei D. Afonso VI.
Foi 19º Senhor de Mortágua.

 
Nuno Álvares Pereira de Melo – 1º Duque do Cadaval

Nasceu em 4.11.1638 em Évora
Recebeu Carta de Conde de Tentúgal a 20 de Março de 1641
Foi criado no Paço Real.
Aos 7 anos sucedeu, por morte, ao seu pai : foi 4º Marquês de Ferreira, 5º Conde de Tentúgal, Senhor das Vilas de Buarcos, da Povoa, de Santa Cristina, Tentúgal, Vila Nova de Anços, Rabaçal, Arega, Alvaiázere, Ferreira de Aves, Vila-Ruiva, Vilhalva, Albergaria, Agua de Peixes, Cadaval, Cercal, Peral, e outras terras, Alcaide-mor de Olivença
D. João IV tornou-o Duque do Cadaval a 26 de Abril de 1648 no dia, em que nasceu o Infante D. Pedro.
Foi pessoa muito estimada por D. João IV até 1656, ano em que faleceu,  e depois pela Rainha D. Luiza, Regente do Reino, que só em 1658 o deixou participar em actividades militares, ainda assim acompanhado de carta de recomendações:
Joanne Mendes de Vasconcellos, meu Tenente Real no Exercito de Alem-Tejo, Eu ElRey vos envio muito saudar. O Duque de Cadaval, meu muito amado, e prezado sobrinho, vay a esse Exercito servirme nesta occasiaõ, o devido, que tenho com elle, a creaçaõ, que lhe fiz, e as grandes qualidades da sua Casa, me obrigaõ a lembrarvos, tenhaes à sua pessoa o respeito, que se lhe deve, e volo digo assim tanto em geral,
porque o vosso juizo, e assento, e a experiencia que tereis, do que se usa nos Exercitos com semelhantes pessoas, escusaõ de vos advertir em particular, e só a levarvos esta Carta se despacha este Correyo. Escrita em Lisboa a 22 de Mayo de 1658.
A RAINHA.”

E em carta dirigida ao jovem Duque,  a Rainha mostra bem a sua estima e preocupação:
“ Honrado Duque, Sobrinho Amigo. Eu ElRey vos envio muito saudar como aquelle, que muito amo, e prezo. Por Carta de Joanne Mendes de Vasconcellos, do meu Confelho de Guerra, e meu Tenente General nesse Exercito, entendi o valor, com que procedestes na primeira occasião, que o Exercito teve de vir às mãos com o inimigo. Alegreime muito de saber, que em tão breve tempo imitaes tão bem os vossos antepassados. Agradeçovolo muito, mas a afeição que vos tenho, a estimação, que faço da vossa pessoa, e muito, que vay em vossa vida, me obriga a encomendarvos, e ordenarvos como preceito meu muito apertado, siguaes nesse Exercito o que vos disser Joanne Mendes de Vasconcellos, que como Fidalgo tão amigo da honra, e tão zeloso das conveniencias do Reyno, vos dirá o como deveis satisfazer a huma, e outra obrigação, e me dareis muito sentimento se entender não executaes esta ordem minha tão pontual, e inteiramente, como deveis. Escrita em Lisboa a 15 de Junho de 1658.
RAINHA”
Foi nomeado Conselheiro de Estado a 10 de Março de 1659, e Ministro do Despacho da Junta Nocturna.
Desempenhou as mais importantes funções no governo do Reino.

Em 1660 casou com a única herdeira do Conde de Odemira (Francisco de Faro e Noronha), viúva do Conde da Feira. O conde faleceu no ano seguinte, e a duquesa em 1664, deixando uma filha que também faleceu cedo, pelo que o Duque do Cadaval acrescentou aos seus já extensos domínios os da Casa de Odemira, entre eles o senhorio de Mortágua.
Casou mais duas vezes:
Em 1671, com a princesa Maria Angelica Henriqueta Catarina de Lorena, que morreria de parto em 1674; e em 1675  com a Princesa Margarida Armanda de Lorena.
A Gazeta de Lisboa Occidental, de 30 de Janeiro de 1727, relatava assim o seu falecimento:
Falecêo na madrugada de 29 do corrente em idade de 89 anos, havendo nascido em 4 de Novembro de 1638, D. Nuno Alvares Pereira de Mello, 1º Duque de Cadaval, 4º Marquez de Ferreira, 5º Conde de Tentugal, do Conselho de Estado e Guerra de S. Mag.; Presidente do Tribunal do Desembargo do Paço, Mordomo Mór das Serenissimas Rainhas de Portugal, D. Maria Francisca Isabel de Saboya, D.Maria Sofia de Neuburgo, e D. Marianna Josefa de Austria; Mestre de Campo General junto á pessoa de S. Magestade, e General de Cavallaria da Provincia da Estremadura e partido da Corte, cuja morte pelas suas muitas virtudes será sensível em todo o Reino.”
Foi o 20º senhor de Mortágua

 
Jaime Álvares Pereira de Melo – 3º Duque do Cadaval
Nasceu a 1 de Setembro de 1684.
D. Pedro II passou-lhe Carta de Duque do Cadaval a 25 de Abril de 1701.
Em 1704,antes de completar 20 anos, foi nomeado para o Conselho de Estado.
O falecimento de  D. Pedro II e a subida ao poder de D. João V, em nada alteraram as relações de confiança.
Em 1713 foi foi nomeado Estribeiro –Mor do Rei
Em 1715, foi nomeado Presidente do Tribunal da Mesa da Consciência e Ordens
Em 1739 foi nomeado Mordomo –mor da Raínha D. Maria Ana de Austria

Gozava de grande popularidade como nos diz António Caetano de Sousa na sua História Genealogica da Casa Real Portugueza,etc:
De tão louvaveis virtudes se orna D. Jayme de Mello, III, Duque do Cadaval, V. Marquez de Ferreira, VI. Conde de Tentugal, do Conselho de Estado, e Guerra dos Reys D. Pedro II. e Dom João V. seu Estribeiro môr, e Mordomo mor da Rainha Dona Maria Anna de Austria, Senhor das Villas de Buarcos, Tentugal, Villa-Nova de Anços, Rabaçal, Arega, Alvayazere, Penacova, Mortagua, Ferreira de Aves, Villa-Alva, Agua de Peixes, Muja, Cadaval, Peral, Cercal, Noudar, e Barrancos, Alcaide môr das Villas, e Castellos de Olivença , e Alvor, Commendador das Commendas de S. Isidro, da Villa de Eixo, Santo André de Moraes, Santa Maria de Marmeleiro, S. Mattheus do Sardoal, na Ordem de Christo , da de Grandola na de Santiago, e da de Noudar na de Aviz, e outras muitas terras, que possue o Duque com grandes prerogativas, herdadas dos seus mayores, apresentando muitas Igrejas, e Prestimonios, e as Alcaidarias móres do Cadaval, e Villa-Ruyva, com as datas dos Oficiaes de Justiça, e Fazenda, e apresentação dos Ouvidores, para o que tem hum Ouvidor da sua Casa, lugar, que occuparão sempre Ministros Togados de grande litteratura, e he hoje o Doutor Fernando Affonso Giraldes , Desembargador dos Aggravos, e Juiz dos Cavaleiros das Ordens Militares deste Reyno, Ministro de grande inteireza, e letras.
Toda esta grande Casa, que logra o Duque D. Jayme com trato magnifico, faz ainda mais distincta as inclinações dos seus divertimentos, mantendo hum grande numero de cavallos de regallo, que se exercitão na famosa picaria, que elle fez construir na sua Casa de Campo de Pedrouços, que fica em pouca distancia de Lisboa, que não cede a muitas das celebres, que se vem em diversos Reynos, a qual frequenta em certos dias da semana com a companhia de muitos Senhores parentes, amigos, curiosos, que se entretem, vendo, e trabalhando elles mesmos os cavallos com muito primor ; porque além do Duque ser eminente na arte da Cavallaria, tem excellentes Mestres desta mesma Academia, que se conserva com largas despezas, não perdendo por ella a inclinação da caça , entretendo tambem Falconeiros para a volateria, e muitos Caçadores para toda a outra na sua Villa de Muja, sendo estes divertimentos seguidos, ainda que com gosto, sem excesso, que perturbassem nunca as proprias obrigações, satisfeitas com tão prodigioso genio, que conseguio o ser bemquisto universalmente, alcançando mais pela afabilidade, do que talvez poderia ter pela elevada representação do seu alto nascimento, porque o respeito, que a fortuna lhe prevenio neste, poderia não merecer no amor, e estimação das gentes, de que será a mais evidente prova, e o mayor elogio da sua pessoa, e Casa, o que não ha muitos annos vimos na Corte de Lisboa, em que ella, e todo o Reyno com hum especial afecto se interessava na sua conservação, como de causa commua precisa à utilidade da Republica, cousa de tanta gloria para a Casa do Cadaval, como já mais vista; porque revestidos igualmente todos de hum desejo, amavão a sua posteridade, não sofrendo, que o Duque retardasse o seu casamento, que depois vendo efeituado, tanto applaudião, sendo inexplicavel o alvoroço, quando nasceo o successor de tão grande Casa , benemerita de tão singular attenção.”
SOUZA, D. Antonio Caetano de: Historia Genealógica da Casa Real Portuguesa, Tomo X , pag. 358  ; Regia oficina Syviana e Academia Real. Lisboa M DCC XL III

Foi o 21º Senhor de Mortágua. 

 Nuno Caetano Alvares Pereira de Melo – 4º Duque do Cadaval
Nasceu em Lisboa, a 18 de Novembro de 1741. Foi o 7º Conde de Tentúgal, em 26 de setembro de 1743 e 4º Duque do Cadaval, por carta de 7 de julho de 1749.
Pertenceu ao Conselho d’El-Rei D. José. Foi nomeado Familiar do Santo Ofício em 21 de julho de 1761
Morreu a 17 de Setembro de 1771.

Foi o 22º Senhor de Mortágua

 Miguel Caetano Álvares Pereira de Melo – 5º Duque do Cadaval
8º Conde de Tentúgal, 7º Marquês de Ferreira
5º Duque do Cadaval por carta de 15 de Maio de 1777
Marechal de Campo dos Reais Exércitos em 9 de Março de 1801
Mordomo –Mor de D. Maria I em 21 de Março de 1807
Membro do Conselho da Rainha D. Maria I
Cavaleiro da Ordem de Cristo
Saiu de Lisboa para o Brasil, com a comitiva real, a 29 de Novembro de 1807.
Morreu na Baía a 14 de Março 1808

Foi 23º Senhor de Mortágua

 
Nuno Caetano Álvares Pereira de Melo – 6º Duque do Cadaval
9º conde Tentúgal, 8º Marquês de Ferreira.
Acompanhou a Corte na sua deslocação para o Brasil, sucedeu a seu pai a 14 de Março de 1808, tendo regressado em 1816
Foi Conselheiro de Estado de D. João VI, e membro da Regência do Reino após o seu falecimento.
D. Pedro nomeou-o par do Reino e presidente da Câmara Alta, em 1826.
Partidário Miguelista, foi Ministro assistente ao Despacho do Infante Regente em 1828. Foi Coronel General do Voluntários Realistas de D. Miguel, e Governador Militar de Lisboa.
Após a convenção de Évora-Monte, emigrou para Inglaterra e posteriormente para Paris, onde morreu a 14 de Fevereiro de 1837.

 
Com a lei da abolição dos vínculos de 1833, foi o 24º e último Senhor de Mortágua.

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